segunda-feira, 17 de outubro de 2011

A guerra entre a Globo e a Record nos Jogos Pan-Americanos 2011

Por Jacqueline

Vi agora há pouco de cabo a rabo o Bom Dia Brasil, um belo telejornal cometendo, uma pena, um pecado capital: omissão completa, sequer citou a palavra Pan-Americanos. Na Guadalajara de tempos sorridentes do futebol de 70 realiza-se um evento esportivo que só perde em grandeza para as Olimpíadas, posto que estão hoje no México milhares de atletas, incluindo a delegação norte-americana. Por causa da guerra profana do Ibope, a TV Globo deu um cala-boca em si própria, censurou-se, esquecendo que o jornalismo precisa prevalecer, apesar das ameaças fundamentalistas da teologia da prosperidade, em família, da família Macedo. O Bom Dia Brasil deu hoje uns quatro minutos de Pelé botando flores aos mortos da Tsunami 2011, deu um minuto para o Santa Cruz que saiu da Série 4 e vai jogar a Série C, deu de tudo um pouco e com a classe de sempre, mas a Globo ficará marcada também para sempre como a emissora que, vivendo de prêmios, vivendo de passados de índices melhores e vivendo um presente de riscos e índices piores, dá as costas aos seu público, nega-lhe a TV aberta, negando espaço aos melhores atletas do Brasil apenas por não poder transmitir ao vivo as competições.
 O JB, naqueles tempos em que definhava por desmandos da família Brito e pela concorrência de O Globo com apoio maciço da TV Globo, não deixava de noticiar a programação do grupo proprietário de um jornal que ameaçava a sobrevivência do matutino da Condessa. O JB impresso morreu noticiando que continuaria digital. A TV Globo, não, ao negar jornalismo a tantos atletas, jovens maravilhosos que tantas emoções e superações propiciaram a si próprios e a telespectadores da própria emissora do Jardim Botânico, ainda tem tempo de repensar essa estratégia maluca de negar a realidade. O pior cego é aquele que além de não poder ver, não quer ver, nega-se a mostrar que perder uma licitação de direitos de transmissão não significa calar o próprio jornalismo.
 E a TV Globo dá um péssimo exemplo para o Brasil que vai sediar o Mundial da FIFA e os Jogos de 2016. O que fará a Globo no ano que vem quando também não poderá mostrar ao vivo as competições das Olimpíadas de Londres?
Como a Globo comprou direitos de transmissão dos Jogos de Londres apenas via TV fechada talvez possa abrir o SporTV, o canal 39 e seus vizinhos, como se estivesse fazendo uma promoção para ampliar o número de assinantes. Poderia talvez anunciar que o SportTV será franqueado ao povão. Será isso legal? Nas Olimpíadas de 2008, esses canais SportTV foram abertos, não sei se por indução do marketing, ou se por indução e grana de Pequim.
A Globo, que nos últimos meses ganhou prêmios maravilhosos e divulgou maciçamente um editorial institucional sobre ética e jornalismo, está exagerando na presunção de que o marketing vem na frente da isenção da reportagem. Nunca é demais lembrar que o maior anunciante da Globo é o Estado, Petrobras, BB, Caixa, ministérios, Secom etc. Pouca gente entre os quase 200 milhões de nós tem acesso aos canais da TV paga. A Globo, para não alimentar as transmissões exclusivas de quem lhe morde os calcanhares, morde o coração de sua grande audiência.
 Essas palavras são de quem torce pela Globo diante do crescimento de uma Record atrelada a dízimos que a Iurd recolhe e aplica alugando espaço para programas religiosos numa  TV com audiência quase zero nas madrugadas, tudo a preço de ouro, algo que todo mundo sabe o que significa: lavar a farra da fé e alimentar uma nova dinastia nascida na cabeça de um ex-técnico da Loterj, um Edir Macedo que aprendeu, na Rua 7 de Setembro, que o melhor jogo é a parada das almas. Vendeu a sua ao mercador de esperanças, autoinvestiu-se de bispo e, como todos os telepastores, fala em nome de Deus e recolhe o preço cobrado de quem crê que está pagando o óbulo para escapar do Inferno.
O Inferno são os outros, já dizia Sartre, o Ateu. Os existencialistas têm sempre razão, inverno pra ela é sempre verão. O Brasil virou uma Martinica, inverno pra ela é uma eticazinha que parece titica, uma política rastaquera de cartas marcadas, licitações entre empresas e empresários amigos, obras caras com material de terceira, unanimidade contra CPMF enquanto os hospitais públicos seguem atendendo bem mau  quem não tem mais saúde para ver o que não passa na TV aberta, o fausto dos ricos e dos políticos rindo de nossas caras e sorrindo por nossos votos.
Torcendo pela Globo e por seu bom jornalismo, sua bela dramaturgia, seus excelente entretenimento...
Alfredo Herkenhoff
Correio da Lapa
Rio de Janeiro, segunda-feira, 17 de outubro de 2011.