terça-feira, 21 de abril de 2009

Senado do Brasil, um drama social

A democracia precisa mesmo de Senado?

Coluna Milton C. da Graça


O princípio fundamental da democracia moderna é “cada pessoa, um voto”, sendo o voto universal e secreto. Para chegarmos ao conceito “universal”, foram muitos anos de luta até serem incluídas todas as cores de pele, os pobres, as mulheres e, finalmente, os analfabetos.

Mas ainda não chegamos ao “cada pessoa, um voto”. E o grande reduto de resistência à democracia plena e irrestrita é o Senado. Em outros países, ele tem outro sentido. Foi criado para que regiões independentes, ao serem integradas a um Estado nacional, tivessem garantia de representação federal, independentemente de sua área e população (casos da Alemanha e dos Estados Unidos, por exemplo). Ou para garantir que certos temas passem pelo crivo de uma elite (econômica, intelectual, guerreira e até esportiva) selecionada pela monarquia – esta desprovida de qualquer poder, mas símbolo da unidade e continuidade da nação (caso do Reino Unido e de outros poucos países).

Nada disse existe no Brasil. O Senado sempre foi ultramajoritariamente representativo das oligarquias proprietárias desde a sua criação. É só olhar as representações de cada estado e verificar os interesses que cada bancada representa. Nas regras para escolha dos senadores – desde a primeira Constituição, em 1824 –, a preocupação óbvia é a de preservar o controle pelos interesses dos mais ricos. Antes na Colônia, o regime de capitanias hereditárias fracassara e o monarca português logo instaurou um governo central. Evitou a fragmentação ocorrida no resto da América Latina e, assim, até a República, o Brasil sempre teve um poder unitário.

O império independente nasceu sob a inspiração de ideias liberais mas centralizadoras de José Bonifácio, pelas quais nosso Pedro I enfrentou a bancada mais reacionária na Constituinte de 1823. Na República é que a coisa mudou. O Exército derrubou Pedro II, mas teve o cuidado político não-revolucionário, porém conservador, de buscar o apoio dos grandes proprietários rurais através da Federação e de sua expressão parlamentar, o Senado.

Getúlio Vargas queimou as bandeiras dos Estados para deixar bem clara a sua disposição de recriar um país unitário, consagrada pela Constituição de 1937 e, só depois da queda do presidente em 1945 e com a Constituição de 1946, voltamos a ter senadores.

Na ditadura militar pós-1964, chegamos a ter senadores designados pelo ditador de plantão – logo apelidados pelo povo de “biônicos” – uma forma curiosa de recriar a aliança da Velha República entre militares e grandes proprietários. E tão empenhados em deixar obstáculos para a democracia que “inventaram” vários novos Estados e senadores. Todos juntos com menos votos do que a soma dos deputados paulistas Clodovil e Maluf.

Hoje felizmente e graças à modernização do país, já conseguimos eleger alguns senadores com outro tipo de representatividade: Paulo Paim (um negro), o respeitável franciscano Pedro Simon, o herdeiro do Pernambuco rebelde Jarbas Vasconcelos, o milionário gladiador dos pobres Eduardo Suplicy, um grupinho de mulheres, em que se destacam positivamente Ideli Salvati, Marina Silva, Patrícia Saboya e Marisa Serrano (Kátia Abreu é a triste exceção que consegue até explicar trabalho escravo) e mais uns outros 15, no máximo, que nunca meteram a mão em cumbuca, procuram honestamente representar seus eleitores e não puxaram o saco dos ditadores militares. Mas isso é ainda muito pouco. O resto, amigos, nada tem a ver com a democracia de verdade nem com o país próspero, justo e decente que desejamos.

Esse resto é maioria nessa representação eleitoral fajuta – chega - a uns dois terços do total, peitando a vontade do povo e a essência das liberdades democráticas, inclusive quase todos os 19 suplentes. O suplente de senador sem voto é, como jabuticaba, um daqueles fenômenos que só existem no Brasil.

Levando em conta todas essas violações dos princípios e boa governança democráticos, precisamos mesmo de Senado?

FIM
Artigo avistado no site: "Andrei Bastos - Blog para contar histórias e discutir questões de cidadania e inclusão social". Endereço>

http://blog.andrei.bastos.nom.br/2009/03/29/a-democracia-precisa-mesmo-de-senado/