quinta-feira, 12 de março de 2009

SOLAR DA FOSSA (2)

LISTA DE MORADORES FAMOSOS DO SOLAR DA FOSSA

Por Alfredo Herkenhoff

Numa pesquisa sumária, compilei uma lista de moradores do Solar da Fossa com uma circunstância,meio nebulosa envolvendo o conceito de morador e morador ocasional, aquele de um dia, ou de poucos dias, em quarto por empréstimo, de favor etc. Mas eis a lista, ainda preliminar, por ordem alfabética:

Abel Silva - Adelzon Alves - Agostinho dos Santos - Antônio Pedro - Arnaldo Jabor - Betty Faria - Caetano Veloso - Capinam – Cassiano - Chico Anysio - Cláudio Marzo - Darlene Glória - Dedé Gadelha - Elba Ramalho - Fábio (do hit Estella) – Fagner - Gal Costa - Gilberto Gil - Glauber Rocha (1968) - Guttenberg Guarabyra - Hyldon - Itala Nandi - Jacobina - Januário (pintor primitivista) - Jards Macalé - Jorge Mautner - José Lewgoy - Júlio Bressane - Lucy Mafra (atriz, e 1ª mulher a ficar numa em capa brasileira – Pasquim) - Luís Wagner (guitarreiro) - MPB-4 - Maria Bethânia - Maria Gladys - Marquinho Dedé - Nelson Luna (médium) - Odete Lara - Octávio Bezerra - Paulinho da Viola - Paulo Diniz - Paulo Leminski - Rogério Duarte - Rogério Sganrzela – Roniquito – Ruy Castro - Ruy Guerra - Sá Gadelha - Sueli Costa - Tim Maia - Toni Tornado - Torquato Neto - Wagner Tadeu Horta – Zé Rodrix - Zé Kéti.

Não moraram no Solar, mas eram freqüentadores, menos ou mais assíduos:

Chico Buarque - Edu Lobo - Nara Leão - Francis Hime - Guilherme Araújo - Cacá Diegues - Martha la Paz – Afonsinho –João Sérgio de Abreu - Roberto Carlos (a confirmar) - Jorge Benjor (a confirmar) - Lincoln Olivetti (a confirmar) - Sérgio Ricardo (a confirmar) - José Celso Martinez Corrêa (a confirmar) - Fernando Faro (a confirmar) - Liminha (a confirmar) - Júlio Medaglia (a confirmar) - Rogério Duprat (a confirmar) - Othon Bastos (a confirmar) - Tarcísio Meira (a confirmar) - E muitos outros a confirmar.

No livro da Editora Rio, Coleção Gente, intitulado apenas “Abel Silva”, este maravilhoso compositor narra, num capítulo, três histórias inéditas sobre o Solar. O autor de Jura Secreta – parceria com Sueli Costa, disse que ainda tem muitas histórias inéditas. Mas Abel Silva bem que alertou para a dificuldade de concretização do livro, explicando que muita gente que morou no Solar não quer expor as loucuras que rolaram por lá. Só uma palavra me devora...

Alguns artistas importantes que passaram pelo Solar já morreram, como, por exemplo, os poetas Torquato Neto, do Piauí, e Paulo Leminski, do Paraná e hoje nome de grande teatro de Curitiba. Cultuado como gênio, este poeta marginal, samurai apocalíptico, em carta ao poeta concretista Augusto de Campos, escreveu: “O nome da obra vai ser Catatau (seu livro de estréia). Estou morando no Rio, no Solar da Fossa, onde morou Caetano. Mandei plantar folhas de sonho no jardim do Solar”. A última frase é um verso de Panis et Circensis, canção de Gil e Caetano, homenageado por Leminski na missiva.

A atriz Ítala Nandi, há alguns anos, propalou o desejo de escrever um livro, misturando verdade e ficção, sobre o Solar da Fossa. Mas, procurada, informou que havia aposentado o projeto. Evidentemente, a atriz teria um papel de destaque no livro pela simples razão de que, salvo engano, tem amplo material, sendo ela própria um manancial precioso. O cineasta Octávio Bezerra, diretor de Uma avenida chamada Brasil, diz que foi ele quem inventou o Solar a Fossa. E insinua: “Sei de muita coisa, tenho muita coisa”.

O próprio Rio Sul é outra fonte preciosa. Por ocasião dos 10 ou 15 anos de inauguração do shopping, sua administração publicou um livro ilustrado, em pequeno formato, para comemorar a data. Mas apenas tangenciou o passado do lugar, exibindo uma bela imagem do velho casarão com seu telhado amplo.

A obra sobre esse “Grande Hotel” das Estrelas requer uma consolidação da origem do próprio nome “Solar da Fossa”, quem o construiu, quando, sua função inicial, sua transformação em hospedaria mambembe de artistas e, finalmente, sua venda e o nascimento do Rio Sul. O Solar da Fossa, resumindo, seria objeto de pesquisa e reflexão. Grandes canções que o Brasil hoje canta foram compostas ali. Foi ali o palco de discussões acaloradas sobre estética. Ali se engendraram parcerias e amizades. A Tropicália se intensificou ali.

No início de 2006, o guitarrista Renato Piau, que conhecia a minha idéia sobre o Solar da Fossa, me telefonou para informar que Toninho Vaz, autor do livro Leminski, o poeta que sabia latim, e de uma biografia sobre Torquato Neto, estava iniciando a pesquisa para publicar um livro sobre as canções compostas dentro do Solar da Fossa. Vasculhando meus guardados, recuperei esse projeto em que eu dizia textualmente: “O livro fará compilação do que se criou naquelas horas no velho casarão. O livro será de grande valia para pesquisadores, compositores, artistas e amantes em geral das artes. O Solar da Fossa, na efervescência criativa de seus moradores, também foi uma ilha de liberdade, não tendo faltado todo tipo de exagero comportamental, em plena vigência do regime militar, que chegou a mandar o Exército cercar o casarão, em busca de subversivos ou drogas. O casarão era a própria subversão, mais existencial do que partidária”.

Uma alternativa para uma eventual escassez de imagem seria a inclusão de fotos dos artistas tiradas à época, ainda que não dentro do Solar. As artistas, que tinham então pouco mais de 20 anos, hoje se aproximam todas de 60, e não seria de bom tom mostrar um conjunto de mulheres famosas com as marcas do tempo. Ou seja, a idéia era privilegiar a inserção de fotos delas quando jovens, no palco ou em ambiente familiar. Claro, haveria fotos atuais, que muitas estão no auge da fama e sempre belas, mas o livro, embora histórico, não teria traço marcante de idade. Longe disso. Haveria uma sensibilidade de edição focando a invenção, a modernidade, a criação, com isso fortalecendo a imagem fashion do próprio Rio de Janeiro, terra de artista, que por princípio, busca sempre o novo e o surpreendente.

A realização das entrevistas propiciaria discussões sobre comportamento, resistência democrática, apoio cultural, movimentos estéticos, parcerias, fama, prosperidade etc.

A vida comunitária no Solar da Fossa também pode ser pensada em contraponto ao movimento hippie internacional. Tardiamente, a comunidade dos Novos Baianos, que dali migrou para Jacarepaguá, talvez tenha sido o ponto culminante de uma tendência comportamental hippie que logo entraria em colapso.

O chargista Chico Caruso foi inteirado do projeto e se dispôs a desenhar a constelação de estrelas do casarão (cerca de 80 rostos) para configurar página dupla da edição de luxo e ainda um grande pôster de lançamento. Este pôster por si só se constituiria numa peça excelente. A propósito, nos anos 80, Chico Caruso fez um pôster semelhante sobre a constelação da MPB.

Vinte anos depois, de memória, toda vez que se organiza um conjunto de artistas no Brasil, é possível pensar que os mortos estão no céu. Os vivos estiveram no Solar da Fossa e volta e meia estão na Lapa.

Hugo Sukman, crítico de MPB do jornal O Globo, escrevendo um livro sobre Caetano Veloso, informou que o artista estava recordando passagens do Solar da Fossa. O radialista Adelzon Alves também andou abordando este passado. O produtor cultural João Sérgio de Abreu igualmente manifesta, de tempos em tempos, o desejo de que se faça algo para recuperar tão maravilhoso legado.

O livro também abriria – aliás, pode abrir ainda, uma janela não só para o shopping Rio Sul, mas o próprio Rio de Janeiro ratificar sua trajetória vitoriosa como pólo gerador de benefícios sociais, incluindo campo de trabalho e espaço para manifestações artísticas, como moda, espetáculos, música, dancing, cinema etc. A própria edição do livro seria – será? - uma confirmação dessa trajetória vitoriosa.

Para encerrar essa digressão. O Solar da Fossa não volta mais. O negócio hoje é Lapa. Montmartre recebe anualmente mais ou menos o número de turistas estrangeiros que visitam o Brasil. A Lapa tem, portanto, muito o que aprender com a globalização.