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Nos últimos meses, o olho clínico, como o câncer da meia-noite, deixa os torcedores brasileiros felizes com um mísero golzinho. O mais doente, desamparado, ainda assim, é um torcedor. Mas não tem mais tempo de vida para saber o resultado. No medo normal de morrer, o que mais assusta é perder os lances decisivos se o Mengão estiver disputando o título. São por essas e outras paixões que os últimos meses de cada um são os mais importantes no calendário particular da coleção de campeonatos.
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Tudo acontece de modo mais dramático nos últimos meses em que a vida se esvai, descobrindo os sentidos que não sobreviverão na aleia do Jardim do Medo. Não adianta buscar o escuro com uma vela acesa. Apaga-se a chama. Acha-se a alma liberta do luminoso frio do seu cadáver rubro-negro.
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Toda alegria, frágil como uma conversa fiada, é tecida no abismo a ser preenchido por atitudes renovadoras nos últimos meses. A falta de ação se assemelha ao excesso de ação. Aprender com o mar, olhando as estrelas, que os governos são provisórios (Getúlio Vargas? quinze aninhos!).
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Nos últimos meses, tudo é receita de receio, a doença particular de cada ser caracterizada pelos problemas sociais cultivados com um ruidoso silêncio, uma lenta correria de olhares pelas paredes e pelo teto no quarto do leito de morte, em vez de cama quentinha.
Nos últimos meses, um vacilo, quando repetido, não é bobeira em dobro, mas história. Qualquer uma, como a do mal namorando a inveja. Que mal é esse? É a volúpia padecendo da falta de queijo e goiabada.
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Nos últimos meses, o enfermo deseja mais graças, perdoando ladrões sem ambição, ladrões que roubam por roubar, cleptos, doentes necessitando de tratamento contra uma neurose incurável batizada de Piroses Pinéicas.
O doente apaixonado, nos últimos meses, apregoa que o amor se agiganta. Quanto menor a perspectiva do cafofo de palha, maior a paixão sem posse. O passarinho de cérebro excepcional voa por toda parte, espalhando os cantares, as reviravoltas que nascem esquecidas no pequeno fim dos neurônios fúnebres.
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Os morcegos no fundo das cavernas olham cegamente em direção à saída para pressentir a presença oscilatória dos invasores, torcedores paleontólogos, predadores, progenitores, joões-de-barro e alibabás, um carnaval de reflexões infinitas como ondas que espelham ecos de estilo de vida no breu completo da cabeça.
Nos últimos meses, o texto se incendeia, dizendo "incendeio-me numa combustão espontânea". A imagem pega fogo na despedida dos últimos meses. Quem quer roubar o meu incêndio? Quem quer roubar uma chama que se apagou? Rouba-se de tudo, até notícia de jornal, roubam-se notas de rodapé nos últimos meses. Nos últimos meses, só não se rouba o coração de um rubro-negro.
* Por Alfredo Herkenhoff