sexta-feira, 22 de maio de 2009

Em defesa dos ratos


Por Sérgio Escovedo

Participação Especial no Correio da Lapa

Fui avisado pelos meus irmãos do Norte sobre uma campanha contra nossa espécie, num país supostamente protetor da natureza, já que possui extensas áreas de floresta e grandes cursos d’água.

Não pretendo me envolver nos assuntos da frustrada raça humana, mas como estamos no Ano do Rato, e rato sou, venho contestar a forma insolente com que se voltam os humanos contra nossa prodigiosa manifestação de vida. Mentiras, calúnias, retórica de aves estridentes – tudo se pratica contra os ratos, inutilmente por sinal. E surge um novo fantasma eugênico, nova mentira social, espécie de moda ou esporte perverso: eliminar indivíduos roedores urbanos por meios violentos e covardes.


Humanos pretensamente democratas pretendem imitar seus piores ditadores, reciclando formas de genocídio abomináveis, agora contra os ratos. Parecem ter esquecido os massacres de milhões de pessoas em nome de causas perdidas. Parece que perderam a razão, pois não vislumbram a causa de seus problemas, que está no próprio homem, a cinco polegadas de seus olhos.


Pois foi o homem que tornou o rato urbano o que ele é. Somos vítimas da péssima administração dessas sociedades nos últimos 10 mil anos, um lapso curtíssimo no universo. Pois se os humanos não sabem sequer como se alimentar, discutem ainda a sua reprodução, usam ciência para se exterminarem, como então pretendem dar lições de vida a nós, ratos sobreviventes de tantas catástrofes?


Não temos os problemas fúteis da espécie humana, alcançamos outro nível de resposta às adversidades e somos o que somos, sem preconceitos. Entendemos a vida e não lamentamos a morte. Toda nossa filosofia está em nossos dentes, se assim se pode dizer. E quantas injustiças sofremos através dos séculos? Nos chamam de sujos, quando se sabe que a pureza só existe para os puros, e a sujeira, idem. Se somos sujos é porque suja é a espécie humana, que não aprendeu ainda a cuidar da escória de sua existência e conspurca as cidades e os rios. Que rato poderia ser tão estúpido? Nossa sociedade é consumidora, recicla matéria orgânica, mas jamais passaria pela mente de um rato estragar um rio para obter pedaços de metal, ou instalar fábricas às margens de rios, lagos e oceanos, automutilando sua própria espécie. E nos acusam de ter espalhado pragas, numa delas exterminando um terço dos europeus. Mas quanta falta fizeram eles? E o que fizeram os europeus na América, na África e nos países muçulmanos? Matança, crimes contra sua espécie, a pretexto de acumular metais e alimentos.


Que péssimos exemplos nos deram os humanos! Quanta vileza, quantas abominações! E não esqueçam que o rato foi o primeiro a se aproximar do Santo Buda, quando O Iluminado abençoou os animais. Onde estava a cabra veloz? O dragão, por que não se apressou? E o que faziam os humanos quanto o Santíssimo pregava o respeito a todos os seres? Pensem, meditem.


Aqui no alto dessa montanha ouvi o apelo de meus irmãos do Norte e aconselho: Tenham paciência com essa espécie passageira. Deixe-os inflar de vaidade e prepotência. Não lamentem os mortos.


Tudo isso passará, para o bem da Terra e de nossos futuros companheiros. Nada será capaz de nos eliminar, porque amamos a Terra e a Vida. Assim seja.