Questões sem respostas
no futuro da Petrobras
Que venham os noruegueses!
Antes de adentrar no campo confuso do Pré--Sal, com Lula dizendo que hoje, 31 de agosto, é um dia histórico para o Brasil, comparando hoje ao Dia da Independência, 7 de setembro de 1822, vamos ver uma historinha ilustrativa sobre boleia de caminhão para apimentar discussões que a grande mídia quase nunca ousa instigar acerca de extração de petróleo a 7 mil metros abaixo do fundo do mar.
Luciana Gimenez na boleia com o ator Luciano Zsafir (fotos nesse megapost petrolífero são meramente ilustrativas, são quimeras, metáforas do pré-sal)
A palavra boleia é uma dessas que assumem significados quase contrários e próximos. Designa no uso mais comum a cabine de um caminhão, mas também foi apropriada por gente humilde no campo para nomear aquela parte de madeira que lhe fica logo atrás, ou seja, o madeirame na frente da carroceria. Sem maiores considerações, eis o que diz nosso pai Aurélio sobre boleia:
S. f.
1. Peça de pau fixa na lança da carruagem, e à qual se prendem os tirantes.
2. Assento do cocheiro.
3. A parte fronteira superior de uma diligência.
4. A cabina do motorista, no caminhão.
5. Lus. V. carona (2).
Um pequeno comerciante numa roça perto de uma cidade pequena tinha um caminhãozinho caindo aos pedaços. Um dia foi comprar uma ferramenta na cidade e voltou com uma novidade.
Mulher, comprei este bilhete inteiro da Loteria Federal e acho que vamos comprar um caminhão de verdade com o prêmio.
Que legal, disse Dona Rosineide, interrompida pelo filho de oito anos que gritou: oba,eu vou agarrado na boleia.
O marido, Seu Zezinho Arteiro, ralhou de pronto cortando a onda do moleque: Vai na boleia coisa nenhuma que é perigoso.
Eu vou agarrado na boleia, insistiu o garoto.
Rosineide lhe veio em apoio: Ah, pode ir na boleia que Pedrinho é esperto.
Eu vou na boleia, gritou de felicidade o menino.
Não vai na boleia coisa nenhuma, não pode ir na boleia, nem a polícia deixa na estrada...
Bobagem, homem, nosso filho pode muito bem ir agarradinho na boleia do caminhão.
Eu vou na Boleia.
Não Vai.
Ele vai.
O Mulher, não enche, não vai.
Vai.
Eu vou na boleia.
Não vai, gritou o pai, e ao gesticular, sem querer abriu os dois os braços tão bruscamente que acertou a face da esposa, que se enfureceu e deu um grito que só uma mulher enlouquecida consegue dar:
Meu filho vai na Boleia.
O garoto, também nervoso, gritou um agudo de doer nos tímpanos: Eu vou na Boleia.
O pai se levantou e ameaçou bater no filho. Não vai.
Ele vai, sim.
O pai abriu a mão direita e estalou um tabefe no ombro da amorosa Rosineide, que tentou reagir mas foi contida por ele aos gritos: Não vai na boleia.
A mãe chorando: Ele vai sim na boleia.
Pedrinho chorando: Eu vou na boleia.
E no fim do dia o bilhete deu em branco.
Moral da História.
Hoje é dia de Boleia em Brasília.
A mídia brasileira testemunhando a presença de 3 mil convidados na boleia do caminhão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, para ouvi-lo lançar sugestões de mudança na legislação que envolve o setor de petróleo, com o argumento de que existe fartura do combustível preto entre 5 mil e 8 mil metros de profundidade.
Por enquanto, a Petrobras só retirou amostras, pistas do óleo abaixo da camada de dois quilômetros de sal compactado, sal que corrói naquelas pressões quase inimagináveis os equipamentos desenvolvidos até hoje pela tecnologia.
O grosso dos 15 bilhões de barris da reserva do Brasil está na camada do pós-sal, ou seja, acima dos dois quilômetros, isto é, sob o leito marinho, variando de 100 metros a 3 mil metros. Este é o petróleo real.
Cada 100 metros mais fundo é um desafio tecnológico. Ninguém sabe ainda qual será a tecnologia, quais os custos,e quais os parceiros para desenvolvê-la.
Mas a ministra Dilma Rousseff, ex-titular da pasta de Energia, está na festa com os 3 mil convidados. Nunca na história do Brasil um projeto de lei (a ser votado no Congresso) foi tão formalmente festejado. Isso é suspeitíssimo. Se isso não é campanha eleitoral talvez seja petroleira, sindicalismo com atraso.
A Noruega, que já teve muito petróleo, fundiu as duas grandes companhias do setor e trabalha até em parceria com a Petrobras no Brasil e no exterior.
Mas, em meados dos anos 60, um então ministro de Energia da Noruega afirmou que se existisse petróleo no Mar do Norte, ele fazia questão de pessoalmente bebê-lo todinho, gota por gota.
Um ou dois anos depois, Oslo e Londres anunciariam megadescoberta sem papo de boleia. Hoje a cada dez poços que fura, a Noruega só acha petróleo em um. O Mar do Norte está acabando. Mas a Noruega, o país de população pequena, nenos de 5 milhões, economizou grana e desenvolve tecnologia de ponta. O fundo soberano deles é uma reserva com cerca de uns 400 bilhões de dólares, o dobro da reserva do Brasil com 190 milhões de habitantes.
A Petrobras, no nosso litoral, a cada três poços, encontra um bom. Mas tudo no pós-sal, isto é, na parte de cima que antes era aclamada como regiões ultraprofundas. Que adjetivo usar para 7 mil ou 8 mil metros? O pré-sal está gasto, parece um cascatol antigo que o PT insiste em tornar bordão da Petrobras, ameaçada de virar a segundinha, só porque o governo federal não tem garra para comprar açoes da estatal de volta, posto que são negociadas diariamente em bolsa .
Não existe apenas insegurança nessas mudanças de Lula alterando regras do jogo. O marco regulatório em vigor levou o Brasil a avançar na pesquisa e produção de petróleo. Dar a essa possível nova jazida este caráter de redenção é mero uso político. Criar uma segunda Petrobras tem cara de política de Hugo Chávez. Por ora, tudo não passa de propaganda maciça do governo, como se o pré-sal fosse uma dádiva, uma realidade divina.
No último mês de abril, a Revista Newsweek publicou matéria de capa, dizendo: Petróleo, sempre mais barato. Oil , forever cheaper. A revista mostrou, ao descontar as inflações dos últimos 150 anos, que o petróleo só fez ficar mais barato, mesmo com previsões catastróficas de extinção do combustível não renovável. E a tendência, sempre segundo a revista, com as novas tecnologias no mundo digital, é desenvolver modelos sustentáveis de energia como as eólicas, solares, nucleares, etanóis etc.
O petróleo, hoje ainda movendo automóveis e fábricas, vai continuar tendo importância, mas relativamente menor do que nos últimos 150 anos.
Antes de Barack Obama terminar o último ano do seu provável segundo mandato, os EUA já estarão com uma parte da frota movida a etanol e eletricidade. Europa e Japão estão lançando carros elétricos no mercado consumidor já em 2010. Não é mais ficção. A Fiat ficou um pouco atrasada nesse campo.
O petróleo da Indonésia sustentou as máquinas do mundo na primeira metade do século 20, mas o arquipélago asiático se lascou. A Nigéria é abundante em petróleo e nada de fazer de inclusão social, país cheio de corrupção e à beira de um ataque de nervos, ou guerra civil com muçulmanos radicais enfrentando o que consideram cristãos demonizados.
Já na França, 95% da energia elétrica é gerada por urânio enriquecido.
Quanto custa uma produção maciça do petróleo a 7 mil ou 8 mil metros? Ninguém sabe. A mídia no Brasil quase só reproduz o que a Petrobras bloga, quase sempre só temos achismo, uma sucessão de clonagem. As discussões estão politizadas também no campo da oposição.
O petróleo, ninguém sabe quanto, abaixo do sal entre 5 e 8 mil metros, totalizaria, na pior das hipóteses, algo em torno de 30 ou 35 bilhões de barris, ou mais que o dobro das reservas confirmadas e comerciais de hoje. Nas previsões otimistas, o óleo das funduras sob as rochas de sal totalizariam de 60 a 80 bilhões de barris. E o Brasil já ficaria entre as 10 maiores reservas. E na versão hiper otimista, o Brasil teria 130 bilhões de barris nas cavernas abaixo das montanhas invertidas de sal, e subiria ao pódio das jazidas campeãs.
Mas quanto custa e quem vai desenvolver os tubos para injetar pressão de um lado e extrair gás e óleo da outra mega mangueira com os mais resistentes componentes jamais produzidos pela ciência?
Estima-se, numa chutologia, que custaria algo hoje em torno de 30 a 50 dólares o Barril. Hoje o custo está em torno de uns 15 dólares no Brasil, talvez. O preço que se paga é o resto: é imposto, que a Petrobras, mesmo tendo o governo apenas maioria de capital votante, ainda é a grande caixa recolhedora de tributos. Não é a coitada da Lina Vieira e outros auditores o problema do fisco. O problema é a injustiça e a ineficiência do sistema que taxa a gente mais pobre via Petrobras.
Mas hoje é só festa. Lula meio chateado porque encontrou dois probleminhas de última hora a ameaçar a solenidade para os 3 mil convidados. Um foi a reunião com os governadores José Serra, Paulo Hartung e Sérgio Cabral. Lula recuou sem que Serra precisasse falar muito, o que seria visto como política eleitoral. Sérgio Cabral foi o porta-voz da trinca. Sem papas na língua, Cabral mandou o recado ao amigo Lula: Vocês discutiram as mudanças em segredo durante um ano e agora a gente vai entubar em uma semana? Lula recuou. Não mexe nos royalties do Sudeste. O encontro durou cinco horas. Esse tempo dá a dimensão de que não se tratou de formalidade. Rio, SP e Espírito Santo vão ficar como estavam. Grosso modo, o esquema atual é 50% de royalties para a União, 25% para os Estados, e 25% para municípios próximos das áreas de extração e produção.
Outra coisa que deve ter irritado Lula e Dilma foi o agendamento da senadora Marina Silva para a cerimônia deste domingo, quando ela assinou a ficha de filiação ao Partido Verde. Marina se declarou pré-candidata à sucessão de Lula. Talvez só não tenha sido lançada formalmente no domingo por temerem os verdes que, do mesmo modo, a festa com 3 mil convidados de Lula em Brasília atrapalhasse a visibilidade da senadora na mídia.
Nunca esquecer que uma notícia forte mata outra menos quente.
Existe pré-sal em outros mares e oceanos? Existe estudo sério na Petrobras sobre o declínio relativo do petróleo como matriz energética principal da humanidade? Um pré-sal, muito além de águas territoriais, a quem pertenceria? A quem chegar primeiro? E se o custo de um barril a oito mil metros ficar em torno de 60 dólares e a cotação do mercado daqui a dez anos ficar a 70 dólares, a valor de hoje, descontando a inflação dessa pequena década futura? Quem bancaria os riscos de tanto investimento em tecnologia ainda inexistente em escala?
Nunca esquecer que o norte-americano Walter Link, no início dos anos 60, fez um estudo geológico para a Petrobras e concluiu que o petróleo brasileiro seria encontrado no mar, bem no fundo. Foi massacrado pela nossa imprensa. E o gringo estava coberto de razão:100%. Precisamos de estrangeiros idôneos e competentes para falar do nosso pré-sal, sem esse envolvimento da política partidária que vai hoje bebericar o anúncio de Mr. Lula da Silva. Que venham os noruegueses.
Por enquanto, a verdade é que está todo mundo com um bilhete da loteria brigando sem saber quem vai na boleia do caminhoneiro Lula, um presidente geólogo na estrada da festa que talvez seja mera ilusão.
Por Alfredo Herknhoff - Correio da Lapa
Para ver uma resenha do Correio da lapa sobre a reportagem da Newsweek explicando o barateamento histórico do preço do petróleo, atenção para os nossos links a seguir:
http://correiodalapa.blogspot.com/2009/07/correio-da-lapa-e-petroleo-post-de-25_20.html
http://correiodalapa.blogspot.com/2009/04/petroleo-barato-no-mundo-pre-sal_25.html
http://correiodalapa.blogspot.com/2009/04/petroleo-barato-no-mundo-pre-sal.html