quarta-feira, 17 de junho de 2009

Giangiacomo Foà, uma lembrança - Correio da Lapa - Jornalismo comentado

Correio da Lapa - Jornalismo comentado (*)

Ao abordar uma das grandes "barrigas" recentes da mídia como um todo, esta do casal fantasma de italianos escapados do Airbus da Air France e tragicamente engolidos pelo asfalto do Tirol austríaco, citei como homenagem o jornalista italiano Giangiacomo Foà, que ajudou a fundar a complicada agência de notícias Ansa. Ele foi sinônimo de reportagem italiana na América do Sul. Este jornalista denunciou como ninguém o genocídio na repressão da ditadura militar na Argentina. Refugiou-se no Rio de Janeiro. Liderou a "casta" de correspondentes estrangeiros por estas bandas . Escreveu livro-reportagem sobre os uruguaios que se tornaram canibais para sobreviver na solidão da neve nos Andes, não havendo comida nos destroços do avião acidentado. Giangiacomo Foà era uma estrela do Corriere della Sera.

Em certa ocasião, década de 1970, tive o privilégio de passar uma noitada em sua casa, entre doses de Stolichnaya na Avenida Delfim Moreira com vista para o mar. O jornalista me disse que infelizmente a mídia do Primeiro Mundo se lixava para quase tudo que acontecia por aqui. Do Brasil, dizia ele, o italianos só querem saber de praia, floresta amazônica, carnaval, seleção de futebol e pouca coisa mais, uma surpresinha aqui e acolá.

Pouco mudou nesses mais de 30 anos. Giangiacomo morreu de infarto no início da década de 90, com apenas 57 anos de idade. Era um senhor bom papo. Denunciou torturadores e bandidagem de todo tipo, da loja maçônica P2 de Licio Gelli, das máfias italianas, e por tudo isso sempre sofreu ameaças de morte no Cone Sul e mesmo na Europa. Ele as enfrentava, claro, com muita tensão e atenção, fugindo quando fosse necessário fugir.

O Leblon virou seu refúgio. Apesar dos perigos todos, aceitava desafios e sabia receber, tinha aquele savoir vivre completo: mulher Susana, filhos, cunhado velejador, enfim, Giangiacomo Foà viveu momentos radiosos. Levava a Itália, a Argentina e o Brasil bem no fundo do coração.

Causou furor na midia mundial quando o Corriere della Sera, sob a chefia de Alberto Cavallari, topou sugestão de Giangiacomo Foà: publicar a lista de italianos desaparecidos, torturados e assassinados nas ditaduras sul-americanas, em especial a argentina a partir da onda Isabelita Perón. O Corriere della Sera encontrou uma forma de mostrar aos europeus que o inferno era uma notícia americana e estava atingindo seus parentes diretos.

(*) By Alfredo Herkenhoff