terça-feira, 10 de março de 2009

BIOGRAFIA DE RUBEM BRAGA (1)

HISTÓRIA DO BRASIL NO DIA-A-DIA RUBEM BRAGA

Por Alfredo Herkenhoff

Ler a biografia Rubem Braga, um cigano fazendeiro do ar, de Marco Antonio de Carvalho, é ato prazeroso de repensar a história do Brasil no século 20 por meio das aventuras do cronista capixaba. O autor morreu meses antes do lançamento do livro, que exigiu 10 anos de pesquisas. Qual filme de ação, o texto começa descrevendo momentos emocionantes de Rubem como correspondente de guerra do Diário Carioca na Itália, onde viu soldado morrendo à sua frente. Mas o batismo de fogo do cronista-repórter especial - dos Diários Associados -, então com apenas 19 anos de idade, foi na Revolução Constitucionalista, de 32, no front mineiro, onde conheceu JK.
Marco Antonio dedicou cerca de 100 das 660 páginas do livro para contextualizar a origem de Rubem e do pequeno Cachoeiro de Itapemirim, num período de Belle Époque provinciana, em que a cidade era mais importante política e economicamente do que a capital, Vitória, graças à pujança do comércio e da agropecuária no sul do Espírito Santo. A ambientação de Cachoeiro nas três primeiras décadas do século 20 se dá num clima de Armarcord, felliniano. Mas a maior parte do livro é cosmopolita: Rubem num mundo de personalidades.
Rubem nasceu numa família de classe média, de muitos filhos e com fortes ligações com a elite local. Seu pai, descendente de portugueses, foi tabelião e primeiro prefeito do município. Proibiu carroça de boi e burro no centro da cidade em 1914, quando Rubem engatinhava.
Nascido em dezembro de 1913, Rubem, no primeiro semestre de 1926, com apenas 13 anos, freqüentava roda de homens já feitos em Cachoeiro de Itapemirim. Bebeu uísque e cachaça com os burgueses da cidade e ouvia um ilustre visitante, Sérgio Buarque de Holanda, que passou sete meses naquele clima interiorano, como colaborador de um jornal local que lhe rendeu apelido entre os boêmios da capital secreta do mundo: Dr. Progresso, nome do veículo diário. Há quem diga que foi lá que nasceu a frase mais óbvia do romantismo brasileiro, pela boca do pai de Chico Buarque. Olhando a Lua, o historiador teria exclamado entre gráficos embriagados: “O amor é lindo!”.
Rubem Braga, com menos de dez anos, deixava boquiabertos colegas de classe e professores por escrever de forma surpreendentemente simples. O livro é a mais perfeita tradução dessa singeleza. A leitura produz embevecimento.
Com 15 anos, começou a colaborar no jornal Correio do Sul, fundado por dois irmãos mais velhos. Rubem conheceu e se apaixonou pelo Rio aos nove anos de idade, em 1922, no centenário da Independência. Voltou a Cachoeiro impressionado com a beleza da Cidade Maravilhosa e com a agitação na capital. Relatou em crônicas infantis esse fascínio pelo Rio. A felicidade, além das reflexões, contemplava frutas, beira de rio, peixes, pássaros, mar e gente simples da roça e do litoral. A felicidade se dava também naquelas rodas de bate-papo com uma burguesia que se assustaria com a ascensão do revolucionário Getúlio Vargas. Rubem odiava o populismo do caudilho gaúcho.
Ainda adolescente, por um insulto de um professor, que o chamara de burro, disse ao pai que queria sair da escola. E saiu no mesmo dia, indo morar com parentes em Niterói. Depois seguiria o irmão Newton Braga, em BH, onde se formou em Direito, sem nunca sequer pegar o diploma.
Um dos fundadores do Partido Socialista Brasileiro, Rubem detestava política partidária, mas nunca ficou distante do poder e das pessoas mais influentes de seu tempo, fossem escritores, jornalistas, empresários, artistas e principalmente pintores.