quinta-feira, 9 de abril de 2009

FOTÓGRAFO GAÚCHO NA LAPA

Gaúcho e Aldir Blanc, dois mestres também na arte do bate-papo com humor, crítica e ironia


Um drama vivido por um dos mais famosos fotógrafos do Rio de Janeiro
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Há 40 anos na noite do Rio de Janeiro, Sérgio Silveira, o Gaúcho, segue serelepe produzindo imagens de anônimos e famosos na boemia da Lapa. Gaúcho já fotografou milhares de vezes pessoas nas principais casas da Avenida Mem de Sá, Rua RiachueLo, Gomes Freire, Lavradio e Largo dos Arcos da Carioca.

Fotografou por exemplo o sócio-gerente do restaurante Nova Capela, Francisco Almuzara, Seu Chico, que não gosta de ser fotografado. Mas Seu Chico está registrado por Gaúcho e ao lado de nada menos do que Madame Satã, o antológico travesti que esmurrou Geraldo Pereira, o autor do belo samba Falsa Baiana. Aliás, é polêmica até hoje e ninguém sabe ao certo se o grande comporitor mangueirense e juiz-forano morreu por causa de um mitológico soco de Satã ou se em decorrência pura e simples do alcoolismo.

Sobre a Lapa ele sintetiza: “Isso aqui é uma ilha de jornalistas cercada de celebridades por todos os lados”.

Depois que apareceu, uns anos atrás, no programa de TV do Jô Soares, que costumava ser visto andando de moto na Lapa, Gaúcho aumentou o preço do seu serviço. Cobrava 10 reais por uma foto, passou a ganhar 15 ou mesmo 20 por imagem.

Há casais que colecionam fotos tiradas por Gaúcho. Toda vez que os amantes vão à Lapa, se sentem à vontade para serem documentados por Gaúcho. O motivo é simples: como usa filme Fuji desse tipo Polaroid, nos últimos anos Gaúcho deixou de produzir um arquivo. Entrega a imagem e não vê mais o que fixou no papel. Não tem negativo. Portanto a prova do “crime” fica com os amantes apaixonados.

Mas um trabalho de pesquisa mostraria que Gaúcho já fotografou personalidades como Cauby Peixoto, Alcione, Oswaldo Nunes, Carlos Alberto, Carlos Machado, José Fernandes, Adir Silva, Zeca Pagodinho, Beth Carvalho, Maria Rita, Mariana Ximenes, Oswaldo Cavalo e mais, muito mais, numa lista que encheria uma página inteira de jornal. Ele faz fotos em casas modernas como o Carioca d da Gema, o Sacrilégio e o Teatro Odisséia. E já fotografou em cabarés e boates do passado, como Carrossel, Abará e Cachimbão.

Há boêmios que saem à noite, enganando as digníssimas com aquela conversa de meu bem, vou ali e volto já, nos tais golpes conjugais manjados, como o da farmácia, o do cigarro e da bolsa esquecida. Esses fugitivos do tédio, mesmo amorosos e fiéis, não temem mais o clique do personagem folclórico da Velha Lapa.

Gaúcho documenta o boêmio com a turma animada, entrega a única foto e não comete gafe. De sua boca não sai uma fofoca da noite anterior. É um verdadeiro diplomata, um exemplo de discrição. Gaúcho está no auge profissional. E já fez de tudo um pouco: já tentou ser malandro e camelô em Porto Alegre, Belo Horizonte e até Brasília. Desistiu. Prefere jogar limpo na Lapa. Em suas andanças, Gaúcho teve família, mulher, namorada, amante. Hoje está só.

Cirurgia à vista

Gaúcho fotografa toda noite em cerca de 20 casas de música e restaurantes da Lapa. Mas com o advento das maquininhas digitais, a demanda caiu e o personagem, que é um ícone da melhor malandragem, está em apuros. Precisa fazer cirurgia com um bom oftalmologista e não tem dinheiro nem para as consultas com os melhores especialistas. Gaúcho hoje faz fotos sem quase nada enxergar. Não vê mais detalhe nenhum, mas enquadra com maestria e tem faro para documenar o melhor.

Gaúcho anda um tanto solitário. Guarda semelhança física com outro gaúcho, o finado Leonel de Moura Brizola. Ironia do destino, agora que entrou na faixa dos 60 anos, Gaúcho enfrenta um problema sério de vista, logo ele que vive da visão. Uma catarata e outros entraves à nitidez. Falta-lhe dinheiro. O fotógrafo mais famoso das noites no Centro do Rio de Janeiro morre de medo de cair na mão de um cirurgião inexperiente ou inescrupuloso ou de ser vítima da rede pública. Queiram Deus e São Sebastião que essas dificuldades sejam superadas pelo bom senso e que Gaúcho resolva mais uma parada em sua vida de aventuras que parecem não ter fim.
Alguém tem alguma ideia para bancar este desafio do pobre Gaúcho?
- Fim - * - Texto e foto de Alfredo Herkenhoff