quinta-feira, 6 de agosto de 2009

As cascatas no discurso de Sarney

Sarney posa como padrinho de Rodrigo Cruz, que diz não conhecer. Foto: Dida Sampaio/AE

Jornal Estado de S. Paulo mostra as cascatas e falhas de Sarney no discurso que nem pôde ser debatido depois de proferido no plenário do Senado

Nota do Correio da Lapa: seguem os trechos mais horrendos desmentidos pelo Estadão:

Srªs e Srs. Senadores, Srª Presidente, até hoje não usei esta tribuna, para rebater as inverdades contra mim disseminadas aqui mesmo e na mídia nacional.

(,,,) Sempre assumi minhas responsabilidades. Presidente, decretei o Cruzado, fiz a moratória. Não eram fáceis as duas decisões. Coloquei a minha cabeça a prêmio, mas abri caminho, para que no futuro chegássemos, através dos vários planos, ao Plano Real e à estabilidade econômica. Tive a coragem de congelar os preços e até hoje pago por essa conduta. Criei o Programa do Leite, o Seguro-Desemprego, o Vale-Transporte, o Siafi, a Secretaria do Tesouro; acabei com a Conta Movimento do Banco do Brasil. Liberei as Centrais Sindicais, legalizei a UNE e os Partidos banidos, como o PCdoB e o PC. Dei o 13º salário ao funcionalismo público.

Aguentei 12 mil greves, sem que nunca tivesse pedido um dia de prontidão militar, e crescemos, àquele tempo, a números que até hoje não se repetiram. Criamos uma sociedade democrática que, num sistema de capilaridade, penetrava em todas as camadas.

Estadão comentando: Em 1988, quando os metalúrgicos de Volta Redonda (RJ) entraram em greve e ocuparam a Companhia Siderúrgica Nacional, o então presidente Sarney enviou o Exército para reprimi-los. No conflito, três jovens operários foram mortos e 31 saíram feridos

Aqui, no Congresso, são várias as minhas propostas. As declarações de bens que hoje nós fazemos como registro de candidatos foram iniciativa minha (...)
Na coerência do meu passado, não tenho cometido nenhum ato que desabone minha vida. Não tenho senão que resistir, foi a única alternativa que me deram.


Plenário do Senado assiste ao discurso de Sarney. Foto: Pablo Valadares/AE

(...) O Senado é uma Casa onde todos temos o mesmo peso, igualdade na representação, na disponibilização de assessoramento, na obediência ao Regimento, na possibilidade de cobertura na TV e na Rádio Senado, na composição dos nossos gabinetes com cargos comissionados.

(...) Os que vêm aqui e muitas vezes me criticam o fazem através da TV e Rádio Senado, que foram obras feitas e executadas na minha primeira administração.

Em seguida, veio a denúncia dos atos secretos. Eu acho que ninguém aqui nesta Casa sabia ou podia pensar que existisse ato secreto. Acho que é necessário esclarecer primeiro ao povo brasileiro o que se chama ato secreto.

Estadão comentando: Sarney anulou os atos secretos num primeiro momento

A parte administrativa do Senado, que tinha o seu boletim interno impresso, com o advento da Internet, para economia e modernização de comunicação, em 2000, depois da minha primeira Presidência, substituiu esse sistema pela Intranet, que é uma Internet exclusiva do Senado, na qual passaram a ser publicados os atos de rotina administrativa do Senado Federal.

Assim, entram na Intranet do Senado cerca de quatro mil publicações por ano. Nos nove anos em que ela existe, não se sabe por qual motivo, 511 atos não foram incluídos na rede. Uma média anual de 56 atos, ou seja, 0,84% das publicações administrativas.

A Constituição diz, no art.37, que a Administração Pública Direta e Indireta de qualquer dos Poderes deve obedecer aos princípios da publicidade, da moralidade e da eficiência. Assim, esses atos, a meu ver, tinham uma nulidade essencial. Por isso, eu, pelo Ato 294, de 14 de julho de 2009, anulei todos eles,

Estadão comentando: Esta semana, o Senado anunciou que abrirá um processo para cada funcionário nomeado por ato secreto. Enquanto isso, esses funcionários seguirão trabalhando

com ressalva das decisões tomadas pela Mesa, porque eu não tinha autoridade para anular atos da Mesa, decisões estas aprovadas pelo Plenário desta Casa. Mas se nós levarmos a uma interpretação literal dos termos da Constituição, da publicidade, que deseja que eles sejam do conhecimento de todos, também os publicados na rede da Intranet do Senado são semi-secretos, porque não podem ser acessados pelo público em geral e somente pelos funcionários do Senado que dispõem de uma senha própria para assim fazer. (...)

Quadro número um: João Fernando Sarney. Aqui no Senado - todos nós sabemos -, não se nomeia para o gabinete quem não for requisitado para nomear pelo Senador; e ele foi feito. Está aqui a requisição ao Diretor-Geral, do Senador Epitácio Cafeteira, que já teve a oportunidade de confessar que não me disse que tinha nomeado.

Estadão comentando: Cafeteira confessou que nomeou João Fernando a pedido de Fernando Sarney, filho do senador


Segundo nome: Vera Portela Macieira Borges. Realmente, é sobrinha, por afinidade, minha. Eu requisitei do Ministério da Agricultura para a Presidência e pedi ao Senador Delcídio que a colocasse no gabinete em Mato Grosso, porque ela tinha se casado, e assim ela continuava trabalhando, não me julgando que nisso houvesse qualquer falha ou qualquer...

Estadão comentando: Nomeada em 2003, Vera Macieira já vivia em Mato Grosso naquele ano. Ela não se mudou para o Estado na época da nomeação

(...) Maria do Carmo Macieira - Eu confesso que não sei quem é. Tem o nome de Macieira, mas também não sei quem é e não trabalha no meu gabinete.

Perdão, ela foi nomeada pela Senadora Roseana. Eu não a conheço. E a lei brasileira não passa responsabilidade de filha para pai. Não há na lei brasileira - está no art. 5º - que a responsabilidade passe de filha para pai.

Pois bem, mas há o ofício da Senadora Roseana requisitando Macieira.

Isabella Murad Cabral Alves dos Santos - Também não é minha parenta. Foi nomeada pelo Senador Cafeteira, que, segundo me afirmou, foi a pedido do Sr. Eduardo Lago, que é primo do Governador do Maranhão, que era meu adversário, e não por mim.


Estadão comentando: Sarney não disse, mas Isabella Murad é sobrinha de seu genro, Jorge Murad. Ele apontou o parentesco do empresário Eduardo Lago com adversários seus na política maranhense. Lago, entretanto, é ligado à família Sarney. A Polícia Federal investiga depósitos feitos por ele, às vésperas da campanha eleitoral de 2006, em contas controladas pelo filho de Sarney, Fernando


Virgínia Murad Araújo - Também nomeada para o gabinete da Senadora Roseana Sarney. Cada um de nós é Senador pelo seu Estado e naturalmente recruta, tem essa liberdade de recrutar quem deve trabalhar com ele. Meu Estado é o Amapá.

Nathalie Rondeau, também não é minha parenta. Não tenho nenhuma ligação de parentesco com ela.

Luiz Cantuária, também não sei quem é Luiz Cantuária.

Estadão comentando: É político do Amapá, ligado a Sarney. Foi nomeado para vaga no Conselho Editorial, que Sarney preside

Rosângela Terezinha Gonçalves, funcionária da Diretoria-Geral, não tenho nenhum laço de parentesco. Nem sei de quem se trata.

(...)

Maria do Carmo de Castro Meira, da mesma maneira, não sei de quem se trata. Funcionária da Diretoria-Geral, mas foi incluída na lista da representação contra mim.

Shirley Duarte Pinto de Araújo, também era do gabinete da Senadora Roseana Sarney. Não era do meu gabinete. Não foi requisitada para nomear por mim.

Rodrigo Cruz, também não sei quem é. Incluíram como se fosse nomeado por mim.

Estadão comentando: Sarney foi padrinho de casamento de Rodrigo Cruz no dia 10 de junho. Rodrigo se casou com a filha de Agaciel Maia, Mayanna. Ele trabalhou dois anos no Senado por meio de ato secreto


Agora, Fausto Rabelo Consendey, também não conheço. Não sei onde trabalha, nem que é meu parente ou que tenha sido nomeado por mim.

(...)Então, meus Srs. Senadores, sou acusado por esta lista que está na representação como se fosse minha, mostrando o meu nepotismo. E aí se vê que só tenho uma pessoa dessas que eu tenha influído que é Vera Portela Macieira Borges, que pedi para botar na Presidência e pedi ao Senador Delcídio para colocá-la.

Dessa maneira a gente pode ver como as coisas são feitas.

Perdão, eu pulei Ivan Sarney. Ivan Sarney trabalhou aqui dois anos. Em 2003, 2004 e 2005, no gabinete do Senador

Ivan Sarney trabalhou aqui dois anos - em 2003 ou 2004, não me lembro, 2005 -, no gabinete do Senador João Alberto, que não é mais nem um gabinete, e é incluído aqui como se estivesse na lista entre a minha maneira de fazer nepotismo dentro da Casa. (Pausa.)


Estadão comentando: Ivan Sarney é irmão de José Sarney. E o ex-senador João Alberto é aliado de primeira hora dos Sarney na política maranhense. Hoje, é o vice de Roseana

Vou repetir o que já disse: essas nomeações eram feitas pelo Diretor-Geral, por requisição do Senador interessado. Foram nomeações para gabinetes. Todos nós sabemos que são privativas dos Srs. Senadores.

Ordenei que... Consta também na minha denúncia por quebra de decoro que mandei quatro seguranças do Senado para minha casa, para fazer uma varredura na minha casa, ameaçada de ser incendiada. Se isso é falta de decoro, quero dizer que nós temos dado aqui aos Srs. Senadores... Muitos deles têm pedido a remessa de policiais nossos ao Estado, e essa é a função da nossa Polícia.

Outra denúncia que fizeram é que meu neto tinha sido privilegiado com agenciamento de créditos consignados de forma fraudulenta. Meu neto nunca teve nenhuma relação com o Senado. (Pausa.)

Estadão comentando: O próprio neto de Sarney, José Adriano, admitiu ao 'Estado' que operava no Senado, que era, nas palavras dele, o 'carro-chefe' de sua empresa. A Sarcris representava o banco HSBC

(...)“Declaro, a quem interessar possa, que o Sr. José Adriano Cordeiro Sarney não é nem nunca foi integrante do quadro de pessoal do Senado Federal, seja efetivo ou de pessoal comissionado, bem como atesto, para todos os fins de direito, que este Senado Federal não tem nem nunca teve qualquer contrato firmado com a empresa Sarcris - Consultoria, Serviços e Participações Ltda.”

Essa é uma declaração feita pelo Senado Federal.

Sua relação era com o HSBC, o maior Banco do mundo, e não podia ter sido colocado, como se aqui no Senado ele tivesse sido posto por interferência de quem quer que seja.

Agora, esse contrato foi feito com o HSBC, a sua concessão, em 2005. Em 2005, quando ele operava, eu não era Presidente, não tinha nada a ver com isso, nem estou sabendo.

O que fiz, quando assumi agora, em 2007, foi ter baixado os juros de todos os bancos para 1,6%. De tal modo que, segundo informação que me deram, eram 29 e baixaram para três, o que mostra o acerto da nossa medida.

E quando eu assumi também, no dia 2 de fevereiro deste ano, o meu neto não era mais credenciado para operar no HSBC, não trabalhava mais com crédito consignado, conforme nota do próprio Banco.

Está aqui a nota do Banco, dizendo justamente isto: que ele tinha sido dispensado... que ele não mais era credenciado pelo Banco.

Meu neto não participou da negociação de qualquer convênio do Banco com o Senado, que foi em 2005; ele ainda nem estava morando em Brasília. A autorização do Banco em que trabalhou foi anterior a minha Presidência e a participação das consignações no Senado nos contratos de sua empresa era residual, limitada a 65 contratos, 3%.

Tratou-se também da Fundação Sarney, acusando-me de nela ter funções administrativas e ter negado isto desta tribuna.

Estadão comentando: Como presidente vitalício, posto que lhe é conferido pelo estatuto da fundação, Sarney tem responsabilidades sobre a entidade. A Fundação José Sarney desviou dinheiro recebido da Petrobrás para empresas fantasmas e para empresas da família Sarney

Quero mostrar o que me faculta o Estatuto da Fundação, pelo parágrafo único do art. 19. Está ali: “É assegurado ao instituidor delegar total ou parcialmente, por prazo determinado, os poderes que lhe são conferidos por este Estatuto.”

E eu, na condição de instituidor, Presidente vitalício e Presidente do Conselho Curador da Fundação da Memória Republicana, com fundamento no parágrafo do art. 18, delego, pelo prazo de cinco anos, ao advogado José Carlos Sousa e Silva - porque tinha que ser delegado, e ela foi renovada de cinco em cinco anos -, inscrito na Ordem, os poderes a mim conferidos por este Estatuto.

A Fundação, Srs. Senadores, não é uma coisa feita de escondido. É uma grande obra, basta ver que, no ano passado, ela foi visitada por 137 mil pessoas que assinaram no seu livro de visita. Está aqui o folder do que é a Fundação. E mais do que isto: quero dizer que é um dos pontos turísticos, estão aqui os Senadores do Maranhão que podem provar. O Senador Mão Santa já visitou também. E está aqui o folder da Fundação onde diz: Instituidor, José Sarney; Presidente, José Carlos Sousa e Silva.

...Presidente: José Carlos de Souza e Silva.

Então, nunca tive nenhuma função administrativa na fundação fundada por mim. Essas são as provas que estão sendo mostradas aqui.

Quero comentar também outras notícias sobre a minha família que nada tem a ver com o Senado. Estavam discutindo, sou Senador e estou sendo representado como decoro parlamentar, mas, colocaram minha família que nada tem a ver com o Senado. E acusaram-me, numa campanha pessoal, de favorecer o namorado da minha neta por um ato secreto, nos trechos dos diálogos divulgados de maneira ilícita, porque ninguém pode fazer isso, gravar alguém e pegar uma conversa interlocutória e divulgá-la sendo segredo de justiça com o objetivo do processo, quanto mais com outra pessoa, e ainda mais com um Senador da República, que tem foro privilegiado pelo Supremo Tribunal Federal. De modo que é uma ilegalidade, além de ser uma brutalidade, que hoje é comigo, mas, amanhã pode ser feito com qualquer um dos Senhores.

Nos trechos dialogados, divulgados de maneira ilícita, verifica-se que se trata de conversas coloquiais entre familiares, que nada tem a ver com processo de segredo de justiça e, pela lei, deveriam ser eliminados.

Não há nelas qualquer palavra minha, mesmo nessa gravação, em relação à nomeação por ato secreto. É claro que não existe o pedido de uma neta; se pudermos ajudar legalmente, qualquer um de nós não deixa de ajudar.

Estadão comentando: Sarney se referia, especificamente, à gravação feita durante a Operação Navalha, que investigou o empreiteiro Zuleiro Veras, dono da construtora Gautama. No discurso, tentou generalizar a suspeita. Não há nenhum questionamento sobre as gravações em que ele se refere à contratação do namorado da neta, feitas em outra operação

A pessoa indicada era competente, formado em Física, pós-graduado e sempre trabalhou com assiduidade...

e recebe elogios dos seus chefes nesta Casa. Sou acusado de ter recebido outra coisa, falta de decoro parlamentar: auxílio-moradia do Senado por sete meses. O auxílio-moradia é legal, é direito dos Senhores Senadores. Muitos dos Senadores recebem auxílio moradia, mas, por uma questão própria, pessoal, eu não quis aceitar auxílio-moradia, e depositaram em minha conta, e eu mandei estornar esses depósitos, mandei estornar, não estava indenizando.

Agora, quero mostrar aos senhores os métodos que foram adotados. Não encontrando nada contra mim, então faltando - acho - notícia, querendo generalizar - os senhores vão ficar pasmados - fraudaram a fita que distribuíram aos jornais e incluíram o meu nome com a voz de uma outra pessoa,

Estadão comentando: O senador não usa o termo ato secreto. Mas foi por ato secreto que, depois de seu empenho pessoal, o namorado da neta foi nomeado

que passa no diálogo pensando que é um interlocutor dizendo: “Eu vou, estou indo para a casa do Sarney”, e aí me colocaram como sendo um homem que participava da Operação Gautama do Sr. Zuleido Vera. Se eu já vi Zuleido Vera três ou quatro vezes na minha vida, foi muito e nunca tive intimidade, nunca frequentou a minha casa, mas fraudaram e colocaram. Isso foi feito numa perícia feita pelo Sr. Molina, o grande conhecido perito nesse assunto. “O negócio não está solto, não. Já, no dia 9, vai chegar à casa do Sarney já, já”, essa palavra não é dele...

(...)

Sou, isto sim: vítima de uma campanha sistemática e agressiva. Humildemente, como é do meu feitio, peço aos meus Colegas que me julguem pela minha conduta austera, sem arrogância, respeitando todos e com todos mantendo boa convivência e não pelas mentiras, pelas calúnias, pelas montagens, como se acaba de ver, pelas acusações levianas de desrespeito às pessoas. Peço justiça, para que possamos sair da crise e voltarmos nesta Casa ao ambiente de tranquilidade. Esta, na razão da minha personalidade, é o meu apelo, é a minha mensagem.

Não vou mudar! Não vou mudar. O meu apelo é a volta de uma convivência pacífica entre nós. O que não posso aceitar é a humilhação de fugir das minhas responsabilidades sem me dar outra solução senão aquela de me humilhar, de me submeter à humilhação pública perante o País.

(...) Minha força não é o desejo de poder. Este cargo não me acrescenta nada senão agruras, injustiças, decepções e trabalho, mas minha certeza de que nada fiz de errado, a minha fé e a minha crença de que as Senhoras e os Senhores Senadores são justos - e a convivência faz conhecer as pessoas, nós nos conhecemos uns aos outros - ajudar-me-ão a reconstruir a paz e a harmonia no Senado, sendo julgado com espírito único de justiça.

Muito obrigado. (Palmas.)