segunda-feira, 26 de agosto de 2013

O caso do senador boliviano: Eduardo Saboia, eis o homem


Eduardo Saboia, eis o homem




O  caso Roger Pinto

Vinte horas atrás,  saudei a participação do senador  Ricardo Ferraço na operação secreta para tirar um asilado político do Brasil da nossa Embaixada em La Paz. Agora, ante os fatos divulgados pela grande mídia, surge a necessidade de saudar em escala exponencialmente maior a figura do  diplomata Eduardo Sabóia, que estava na função de encarregado de negócios na missão brasileira na capital da  Bolívia e que foi , segundo ele próprio, o mentor maior da operação humanitária.

Parabéns Eduardo Sabóia! Parabéns Ricardo Ferraço! Parabéns a todos que tiveram participação  nesse episódio político,

Teço essas considerações e de imediato me remeto ao saudoso primo Augusto Estellita Lins, o mais jovem  a entrar no Itamaraty e em cuja casa vivi por mais de ano, em Roma., quando ele servia na Embaixada do Brasil junto à Santa Sé. Augusto Estellita Lins, mesmo nome do irmão da minha avó materna vovó Aurora, o tio Augusto Emilio Estellita Lins, ou simplesmente tio Lins, e  mesmo nome do meu irmão pintor, o Augusto Emílio hoje um Herkenhoff morando em Petrópolis,  enfim., teço, essas considerações porque vejo dignidade e tradição nesse tipo de ação.

Nas relações internacionais tudo é linguagem estudada para evitar desentendimentos que podem conduzir a mal-entendidos e,  numa cachoeira de vacilos, conduzir a crises de linguagem, conflitos e mesmo guerras. Há de se ter modos no relacionamento entre representantes políticos de nações, sejam vizinhas, sejam distantes geograficamente ente si.

Embaixador é o representante de um chefe, seja premier, presidente ou rei. Fala e decide em nome do chefe. Isso era mais forte quando se andava de navio e não existia telefone. Hoje é ainda representante, mas com a informação em tempo real na Era Digital o cargo de embaixador perdeu valor, virou quase um agente cultural ou um apaniguado curtindo um cabide de emprego de luxo.  Isso na média universal. Na crise, o embaixador  ainda tem seu valor de representante do nosso chefe político e, por extensão, representante de todos nós enquanto um povo.

Em alguns momentos de crise, dois países ficam sem embaixador, e seus interesses são negociados por uma outra embaixada, uma missão diplomática que se relaciona bem com os dois países que não se relacionam bem. Em alguns momentos de crise, dois países, mesmo sem embaixador, negociam numa tradição de crise: em vez de embaixadores, esses dois países têm encarregados de negócios.

O encarregado de negócios é um tipo  de embaixador em situação especial, de crise. E a crise pode estar no pais  de origem deste diplomata ou no país para o qual ele é designado a servir. Mas não importa a situação: o encarregado é um nome aparentemente menor porque o poder que o nomeia está fraco em seu próprio país ou porque o seu próprio país está irritado com o país para onde ele é enviado.

 Os EUA podem ficar sem relações diplomáticas com uma nação, por exemplo, o Irã, Washington pode ter uma missão diplomática amiga ou neutra para cuidar de negócios por exemplo no Irã, uma Suíça da vida, ou pode, numa aproximação, ter uma missão diplomática em tempos de crise com um encarregado de negócios em  vez de ter um embaixador.

 A questão da linguagem diplomática é importante. Este cargo, esta função que é a de um embaixador, exibe uma situação: ou o país  onde o encarregado vai servir está com sérios problemas com relação ao país que envia tal funcionário, ou o país que o envia também não está bem politicamente para enviar um embaixador. A figura do encarregado de negócios é uma figura crítica, é emergencial, independe de formalidades e protocolos, independe de confirmações das forças políticas que sustentam o  Poder Executivo. O encarregado é o nome que o chefe de uma sociedade envia à outra na marra, sem rituais de aprovação nem   na origem nem na capital onde o funcionário nos representará.

A Bolívia não tem um embaixador do Brasil em La Paz porque está em crise. A Bolívia é criticamente pobre desde a origem. Mas não tem embaixador porque  nesta quadra da história La Paz está fazendo uma lambança especial. Brasília não nomeia um embaixador para dizer, de forma insinuosa a la Paz, que não está gostando do que ocorre na Bolívia com relação aos interesses brasileiros.

A experiência da Bolívia nas relações exteriores é de derrota. Perdeu um mar para dois países, Chile e Peru. A experiência do Brasil é vitoriosa e respeitosa, nossas amplas fronteiras não foram desenhadas por conquistas militares, imperiais ou  políticas, mas por sedução, por convívio. Tordesilhas era uma fragilidade imaginária. Amapá e Acre são  realidades econômicas e culturais brasileiras.

O Brasil  nunca quis um palmo de terra alheia. O Brasil cresceu porque estendeu a mão, a palma da esperança. Seja um de nós, e vamos falando português. Portugal, a nossa origem, é pequenininho. O Brasil é pequenininho, surgiu no mapeamento colonial antes de Cabral na cidade espanhola de Tordesilhas,  foi   batizado com nome de ilha,. mas cresce, cresce na dor, na violência interna, cresce na vontade imensa, cresce na esperança, infinita. Cresce porque estende a palma da esperança.

A Bolívia não  cresce porque nasceu da morte incaica. Os antigos andinos caminhavam sem conhecer sequer a roda, que dirá a pólvora dos espanhois. E a Bolívia nação, mescla de incas e europeus, nasceu de um sobrepujamento, nasceu neste ressentimento das violências infligidas à  região. Quanto mais a Bolívia sonha em ser forte, mais fraca fica.


Dois episódios à guisa de ilustração: um das últimas horas outro de  meses atrás: um adolescente que gostava de futebol e um senador que se destacava na oposição ao governo bolivariano de Evo Morales...

 O adolescente foi assassinado com um tiro de foguete sinalizador que entrou por um olho e atingiu  o cérebro. O torcedor corintiano que matou não foi identificado.  Um menor de idade no Brasil assumiu a autoria de disparo, mas a Bolívia manteve 12 torcedores brasileiros encarcerados por meses a fio. Que Justiça foi aquela? Que Justiça a nossa, lenta e cruel, cheia de filigranas e procrastinações?

O senador refugiado na embaixada do Brasil enfrentava 20 acusações, todas tão perfeitas quanto as que mantiveram os 12 torcedores presos. O regime bolivariano rasga contratos, e nem precisamos conhecer as acusações contra o senador Pinto Molina para ver o quão frágeis devem ser.

Há uns cinco anos, sei lá, o regime pró  Hugo Chavez de Evo Morales quase gerou uma guerra civil, contrapondo bolivianos da agropecuária que moram nas partes baixas, amazônicas e quase mato-grossenses aos andinos pobres e maltrapilhos. Sem me estender, Hugo Chavez de uma feita comprou em Moscou 100 mil fuzis Kalachnikov. Para que? Enfrentar americanos? Enfrentar colombianos? Enfrentar brasileiros? Não. Comprou para mostrar aos próprios venezuelanos que a revolução bolivariana é para os próprios venezuelanos se lascarem mesmo. Há uns cinco anos, quando a oposição ensaiou sair às ruas, também surgiu um clima de guerra civil em Caracas...

No Brasil com a Justiça lenta que só reza pela constitucionalidade nas questões pontuais envolvendo maiorais, neste Brasil sem hospitais decentes e sem escolas decentes para as crianças, num pais com jovens nas ruas dando sinais claros de impaciência diante do vandalismo cotidiano da classe política, “importar” cinematograficamente um senador estrangeiro, tirá-lo de uma montanha sem leis, trazer um político empresário da parte baixa da Bolívia, um homem acusado de fazer exatamente o que ele acusa o governo de fazer, de estar associado ao narcotráfico, soa quase uma temeridade. Já ouvimos vozes assim: temos tanto político safado e ainda vamos alimentar mais um corrupto?

 Mas, não, a operação que tirou um preso político adoentado do cárcere em que foi transformada a nossa embaixada é um ato humanitário, vi isso na primeira noticia no Google news. Saudei o senador Ricardo Ferraço pelo seu envolvimento, sem ainda saber nada  que o mentor da fuga fora o próprio o encarregado de negócios, o ministro Eduardo Sabóia operando, aparentemente, à revelia do “chanceler” sem pasta, o plenipotenciário bolivariano Marco Aurélio Garcia, aquele que desserviu a Lula e não sei o que faz com Dilma, que vai dando pequenas guinadas nas relações internacionais antes tendendo a simpatias com loucos mundo fora como aquele ex-presidente iraniano enlouquecido de xiitismo.

Eduardo Sabóia honrou o próprio nome e honrou a tradição do Brasil em receber gente de todas as partes do mundo, gente de todas as dores do mundo. E os que o ajudaram, autoridades e servidores humildes, igualmente honraram a que nos resta de brasilidade. Pensar no próximo, um estrangeiro, num momento em que o Brasil está tateando passos convulsivos para apressar a sua própria justiça, eivada de leniência e marasmo.

 Amanhã, pasmo, posso descortinar o governo Evo Morales abrigando alguns réus condenados do mensalão, se estes entenderem que uma temporada na Bolívia será menos pior do que uma temporada  num presídio brasileiro reformado às pressas  para recebê-los.

Alguns dos condenados do mensalão foram perseguidos políticos, alguns foram acusados e corretamente condenados por causa da política, fizeram política, mas caíram nas pequenas tentações, roubaram merrecas. Alguns ali ajudaram de forma fundamental a diminuir a fome no Brasil e com isso salvaram milhões de crianças carentes.

 Mas isso é outra história. A fome diminuiu muito no governo FH. Diminuiu muito mais no governo Lula. E a Fome voltou a ameaçar no governo Dilma por causa da inflação que o IBGE não capta com eficiência. Cai o preço do tomate que virara diamante e voltou a ser tomate nas sazonalidades. Mas o inhame no Rio de janeiro há seis meses.está a mais de 4 reais o quilo  Desde o início do ano um quilo de farinha de mandioca no Rio de Janeiro custa três vezes mais que um quilo do trigo imp ortado da Argentina ou dos Estado Unidos.

O Plano Real/FH/Lula deu macarrão  e celular. Mas os brasileiros agora querem  a macarronada e o fim da conversa fiada. A rua chegou, e Roger Pinto Molina, Eduardo Sabóia. Ricardo Ferraço, Cristóvam Buarque, enfim, quaisquer autoridades serão bem-vindas se quiserem chegar a elas como cidadãos comuns, exigindo mudanças, mudanças drásticas.Pinto Molina, como refugiado, não pode fazer política, mas pode ajudar a sonhar.

Eduardo Saboia  escreveu drasticamente um capítulo na história do Brasil diante da covardia do regime bolivariano e da lentidão do governo em Brasília. Agiu de acordo com a própria consciência.

 Parabéns Eduardo Sabóia. Você acaba de ganhar o meu voto. Vem pra rua!


Alfredo Herkenhoff, Rio de Janeiro, 26 de agosto de 2013