EMOÇÃO NAS NUVENS
Três anos depois da tragédia do jato da Gol na colisão com o Legacy novinho em folha comprado por uma empresa de táxi aéreo dos EUA, permaneço com as minhas convicções: um choque a 10 mil ou 11 mil metros de altura, na vastidão do céu amazônico sobre um chão supervoado de verde, só pode ter sido manobra premeditada. Adoro teorias conspiratórias.
Os dois pilotos americanos estavam tão confiantes na tecnologia do aparelho montado em São José dos Campos que, em vez de ligar o radar anticolisão e tirar uma cochilada, preferiram brincar de atingir ou ameaçar atingir qualquer coisa que voasse naquela altitude. Deliberadamente, de forma irresponsável, buscaram atingir o avião de passageiros. O choque e a aterrissagem perfeita do Legacy foram um verdadeiro gol de placa para o marketing da Embraer e da companhia de táxi aéreo americana, outra empresa que cresce, prestigio crescente.
Os dois pilotos, mantidos em cárcere público-privado, isto é, proibidos de sair do Brasil durante uns 100 dias, isto é, mantidos em hotéis de Mato Grosso e Rio de Janeiro, foram tratados como heróis ao chegarem de volta aos Estados Unidos. O repórter do
The New York Times, alheio a esses transtornos conspiratórios, emocionado por ter se salvado a bordo do Legacy na tragédia, prometeu, segundo a mídia, que faria um livro ou uma bela reportagem em honra a todos os 150 e tantos mortos na queda do Boeing. Terá a imprensa distorcido os fatos ao noticiar essa intenção do repórter do jornal nova-iorquino?
Compreende-se a dor dos parentes das víitmas, a revolta, o direito à uma justa indenização. Mas querer satanizar os dois pilotos amricanos me parece mais um exagero da nossa nacionalidade.
Homicidio culposo, nunca assassinato. Peça do destino, nunca assassnato. Um botão contra colisão no céu amazônico deixou de ser apertado. Apertemos o cinto. Vamos melhorar o ensino no Rio de Janeiro, onde a rede estadual está ranqueada como uma das piores do Brasil, em rota de colisão com o bom senso, crianças e adolescentes desamparados, professores mal pagos, botões nunca apertados desde que a Cidade Maravilhsa deixou de ser a capital federal 50 anos atrás.
Ou, noutras palavras: vamos parar de encher o saco de quem sabe o que faz, como os pilotos americanos, Vamos tratar de enfrentar os pilotos crueis e assassinos do nosso destino coletivo, que são os péssimos políticos que elegemos. Vamos respeitar os bons políticos, os bons pilotos.
A justiça brasileira, que prendeu os dois pilotos por mais de 100 dias num caso de, no máximo, homicídio culposo, um caso raríssimo nas alturas, é morosa 24 horas por dia com assassinos frios e calculistas em cada esquina, justiça leniente com ladrões, com 300 congressistas de todas as legislaturas sob suspeição na avaliação de um outrora aguerrido deputado Lula, autor destes 300 xingamentos, 300 nada espartanos, raposas espertalhonas, Lula e esta imagem que ganhou canção do Paralamas do Sucesso, os 300 picaretas.
A mídia, mais do que deformar os leitores, os forma. Já a televisão enlouquece a massa, manobra a massa e, em troca desse nosso enlouquecer, cobra rios de publicidade dos poderes públicos. Se não anunciar na grande mídia, leva porrada. Se anunciar, resta pelo menos a luta pela salvação numa política editorial de morde e sopra. No mais, é o carnaval em cima das tragédias do cotidiano.
Sim, indenização justa. Mas por favor, parentes das vitimas do Gol, parem de satanizar os dois pilotos americanos, dois sobreviventes da aviação. Não sejamos cruéis com quem quase morreu. Morremos todos um pouco com a tragédia. Mas vamos morrer muito mais se continuarmos achando que os americanos são sempre os culpados. Não é que sejam inocentes, anjinhos que caíram felizes na Serra do Cachimbo. Apenas sobreviveram por obra do destino ou da tecnologia do Legacy e voltaram aos EUA apavorados com a burocracia e o cinismo do Judiciário do Brasil.
Estou mais preocupado com o teor do livro que até agora não saiu do repórter do NYT.
Sobre a loucura da midia em casos de grandes acidentes de aviação, lembro que neste
Correio da Lapa, um ano atrás, duvidei de uma noticia que correu mundo em dois tempos, separados por dez dias. No primeiro, a história de um casal de italianos que na última hora não embarcou no avião da Air France que cairia no Atlântico. O casal teria embarcado no dia seguinte, para Lisboa e logo Mônaco. O casal ainda curtiria o resto do mês de férias. Depois Paris e depois Munique, onde o marido e sua mulher Johanna Genthaler alugariam um carro e voltariam felizes para o doce lar na Itália alpina, perto da fronteira com a Áustria. Mas no Tirol, no outro lado dos Alpes, eles morreriam num corriqueiro acidente de automóvel. Pesquisei a fundo e não tive nenhuma comprovação da noticia, da morte, ou sequer da existência de tal casal que midiaticamente escapara da tragédia no nosso Atlântico nordestino.
A noticia, talvez a maior barriga (*) d2 2009, saiu no mundo iinteiro, primeiro como nota da agência italiana Ansa. Depois saiu no Globo, no Estadão, na TV e em toda parte. Depois saiu até no sisudo Financial Times de Londres. Mas, prova que é bom, prova. da existêencia daquela história, não, nenhuma encontrei. Só o
Correio da Lapa errou. Errei sozinho. E até hoje aguardo prova de que Johanna Genthaler e seu marido escaparam do vôo 447 para morrer perto de Salzburg. prova de que foram enterrados e chorados... Não, nenhuma, nenhuma encontrrei. Saiou no mundo inteiro, menos no Tirol, salvo engano...
A noticia muitas vezes embute uma verdade que está na capacidade critica de quem a lê para compreender como foi editada, com que linguagem, com qual destaque. Além do
lead (o que, quem como, onde e quando), a notícia embute um outro item fundamental: o para quem. Sim, para quem sai uma noticia? Para quem uma determinada versão vem à luz?
Sejamos cuidadosos com nossas emoções. Emoções costumam ser traiçoeiras com a subjetividade inevitável em todo ato de noticiar.
(Por Alfredo Herkenhoff)
http://correiodalapa.blogspot.com/2009/06/jornalismo-da-ansa-e-morte-na-estrada.html
(*)
Barriga
Erro de informação publicado. Erro grave cometido na edição. O jornal come barriga, dá barriga, leva barriga ou faz barriga quando publica erro.
Definição de barriga extraída do inédito
Glossário de Jornalismo
e
Dicionário de Apoio
Alfredo Herkenhoff