sexta-feira, 19 de junho de 2009

A gente é feliz por um triz no minuto que respira


A gente é feliz no minuto que respira. Por isso todo cuidado é pouco no doce arfar do minuto seguinte. Instantes estelares, de Zweig, nos dá a dimensão de como somos voláteis e volúveis. De como o destino pode ser decidido num átimo, na escolha individual diante de um caminho que se bifurca em detrimento de toda a teorização sobre determinismo de circunstâncias históricas, fatalismos e elucubrações religiosas.


Thomas de Quincey também passeou pela história e, nos seus ensaios reunidos sob o título de O assassinato como uma das belas artes, desfralda coincidências, observando que muitos homens famosos, geniais, quase sempre têm, em sua biografia, passagens em que por questão de minutos não perderam a vida.


Os hispânicos de izquierda nos fizeram cantar que a vida é eterna em cinco minutos. Warhol sintetizou o efêmero dos falsos brilhantes ao vaticinar que no futuro todo mundo será famoso por 15 minutos.

Com menos ou mais profundidade, brincamos com o tempo curto, nossos passatempos entre uma visão menos ou mais clara do devir que nos aproxima da morte. Caetano, ao fazer Trilhos urbanos, chamou ao memorialismo um passado que ainda era futuro, o sucesso que Gal Costa ainda estava por estabelecer com a canção Balancê. O tempo nunca envelhece, diriam Cazuza e Arnaldo Brandão como cancioneiros do rock.


Envelhecemos nós, que somos vinho de boa pipa e regamos nossas palavras com memória e a escrevemos como trabalhos de arte, com a função de ser apenas o que é, embora possa ser tudo o mais que as palavras ensejarem. Liberdade em progresso, escravidão em processo.


Foi dito que Nélida Piñon numa ocasião estabelecia que, antes da primeira letra, um romance tivesse determinado número de páginas. O que parece uma prisão, o quadro, é apenas paisagem. Valery enfeitou o pensamento de poeta e matemático, frisando que "a maior liberdade vem do maior rigor".


Mas por que estou a dizer tudo isso que vem à mente? Porque gostaria de um intróito para alardear o meu fim, a minha própria mania momentânea de me circunscrever a minutos. Impus-me com rigor que cada comentário que faço, não exigindo pesquisa, tem de ser exaurido em 40 minutos no máximo. Uma crônica viciada no tempo de 40 minutos que, hoje, são o sucedâneo de 40 anos de experiência de vida longe da infância.


Vale a pena? A pequena biografia, aos 55, explode nesse instante como avalanche no Passo Brenner, comunhão com o papa, lanche de carne de tatu ao amanhecer no teto do Trem da Morte à época de Hugo Banzer, correr, aos dois, atrás de um gato na pista do Aeroporto Santos Dumont, acalmar, aos 27, dois cães hostis na escadaria do Cristo Redentor durante passeio com uma jovem na madrugada lá nas grimpas, participar das passeatas pela anistia durante o governo Figueiredo, votar, mas nunca ter eleito um presidente no Século 20. Escrever, ler, rever. Jornais? Vale?

By Alfredo Herkenhoff

a poem is never finished, only abandoned: Paul Valery