quinta-feira, 11 de junho de 2009

Thereza Christina e Poemas do Amor Abelardo e Heloísa

POEMA II

O MAIS PURO AMOR

Deixa a voz alçar o voo leve
na noite que temos para nós.
Estás à beira de tua honra e eu à beira de ti.
Não me comovo às lágrimas,
senão por teus olhos e eles veem o que há em mim.
Não sou senão a serva de um amor imenso,
este que me habita e me devasta.
Por onde me leve, o amor me tem pela mão,
e me guia até onde estás.
Qual breve perfume dessas horas se destila
nas pétalas da flor que nos olha?
É seu aroma ou o nosso que sentimos?
O meu amor é mais puro por não ver
nada mais nem outro senão a ti.


Alfredo

acabei de explicar ao Guilherme Zarvos e tenho dito a alguns amigos que me escreveram também perguntando sobre as "traduções" destes textos. Não são traduções. são poemas meus sobre Abelardo e Heloísa, tema este que leio sobre ele desde os 15 anos de idade quando vi uma peça de teatro sobre os dois, mas que somente agora aflorou em forma de poesia. notei que os poemas têm causado uma espécie de comoção entre os que os leem, sem saber do que se trata. Você não deve ter recebido o 3 por lapso, pois postei todos eles à medida que tenho escrito. e devido ao interesse, criei um blog para mantê-los juntos: >
http://omaispuroamordeabelardoeheloisa.blogspot.com/

onde você poderá consultar o terceiro que lhe falta à coleção.

Parágrafo do Correio da Lapa: Enviei email para Thereza Motta reclamando que eu não recebera dela o poema número III sobre o mais puro amor entre Abelardo e Heloísa, casal de uns 800 anos atrás. Disse a ela que tinha gostado dos poemas 1, 2, 4 e 5. E ela me dá agora esta excelente explicação e notícia: os poemas são dela sobre o velho caso que integra antologia mundial do tema. Se fossem originais de Abelardo, teriam sido lavrados em latim. Imaginei que Thereza, que traduz Shakespeare, estaria num trabalho de tornar contemporâneas traduções de séculos atrás que, alias desconheço. Mas prossegue Thereza Motta:

Este é um método meu de trabalho, de pesquisar um tema e explorá-lo escrevendo poemas sobre o assunto. fiz o mesmo com Marco Polo e a Princesa Azul (publicado em 2008) >
http://marcopoloeaprincesaazul.blogspot.com

que cheguei a verter para o inglês e Odysseus e o Livro de Pandora (ainda inédito em livro) > http://odysseuseolivrodepandora.blogspot.com

Mas este sobre Abelardo e Heloísa me pegou de surpresa, pois nem eu esperava escrever sobre eles. Como venho de publicar os 154 Sonetos de Shakespeare e comecei a traduzir os 44 sonetos de Elizabeth Barrett Browning que ainda estou lendo para continuar a empreitada, as pessoas em geral pensam que estes poemas sejam traduções, porque o tema é muito antigo, do século XII e muito se tenha escrito e falado sobre eles.

Então, os poemas são meus, que tento manter na forma do soneto (14 versos), sem a necessária métrica, mas com a musicalidade inerente à fala e ao discurso dos dois, que se depreende de suas cartas que tenho lido e relido, bem como vários outros livros que tenho sobre eles, fora a memória da peça e do filme que foi feito sobre os dois.


POEMA IV

DE ABELARDO A HELOÍSA

Tens razão em tua revolta,
tens razão quando clamas por justiça.
Deus não se apiedou de nossa falta.
Ele não se curvou à nossa vontade.
O que faltou a nós para respeitá-Lo,
que do Amor sagrado desconhecemos?
A nós coube a culpa,
a nós coube o lamento.
Tua dor não é só tua.
É meu também o teu tormento.
Meu sangue me cobriu,
como te cobriu o teu.
De ti, nasceu um filho.
De mim, minha vergonha.

Alexander Pope escreveu um longo poema de "Heloísa a Abelardo" no século XVIII (1717) e é um dos mais conhecidos sobre o tema. Ainda não o li com calma, mas terei de fazê-lo durante minha pesquisa, pois é uma das coisas a que me obrigo é ler tudo sobre o assunto que estou escrevendo, como fiz com Marco Polo para escrever meu livro.>

http://rpo.library.utoronto.ca/poem/1630.html

Ambos ficaram conhecidos pelas cartas que trocaram quando já não viviam mais juntos (depois do casamento mal sucedido e da trama para tentar ocultá-lo). A história parece shakespeariana no que tange padres que tentam ajudar enamorados e termina em tragédia num clima medieval. Toda a trama é real e não precisa de invenções para aumentá-la, embora existam vários mitos sobre eles (como do enterro de Heloísa que Abelardo teria aberto os braços para recebê-la, uma bela imagem poética e metafórica) e continuam enterrados juntos até hoje no Père Lachaise em Paris, onde se casaram (na Notre-Dame!).

Ou seja, o assunto é apaixonante e pega todo mundo desprevinido pelo vigor com que é contada até hoje. Os poemas me pedem para ser escritos, e tomei como aprovação tácita deles uma amiga ter-se oferecido para levar os dois primeiros à tumba deles pois estava para embarcar para Paris nos dias seguintes a eu ter começado a escrevê-los. Esta é a história dos poemas. Até um amigo que é músico disse que quer musicá-los tal a sonoridade dos versos, que há muito ele não via em poemas meus. Entre surpreesa e feliz, vou continuar escrevendo até completar a saga, tentando caminhar por todos os meandros da personalidade de ambos e ainda do filho que nasceu do amor deles, Astrolábio, uma rearrumação do nome de Abelardo (ter pais intelectuais dá nisso), embora eu ache linda essa palavra e o significado dela.


POEMA V

DE HELOÍSA A ABELARDO

Senhor, pai, esposo, irmão, amado,
ouve o chamado de todas as vozes.
Dissemos o que não poderia ser dito.
Fizemos o que não poderia ser feito.
A nós, restou a renúncia,
o gesto extremo de deixar partir
o maior bem, o que mais se queria,
cuja solidão não consola,
cujo abandono não compreendemos.
O amor foi maior que tudo.
E este o silêncio que nos impusemos.
Nada nos restou dizer. Vivemos tudo antes
Que a mão avara nos cortasse ao meio.


Para lhe contar outra novidade, saiu a resenha sobre meus 154 Sonetos de W. Shakespeare no jornal rascunho que se você não tiver o exemplar poderá ler em >

http://rascunho.rpc.com.br/index.php?ras=secao.php&modelo=2&secao=2&lista=1&subsecao=5&ordem=3049 .

Aprendi que não posso publicar tradução sem dizer como e por quê traduzi, como fiz nos 44 Sonetos Escolhidos, de 2006, em que contei como foi minha experiência de traduzir os sonetos. Como já tinha feito isso então, dispensei a necessidade de apresentar os meus motivos, o que, parece, para o leitor, ser algo necessário.

Beijos, fico aqui à disposição para qualquer outra explicação que precise. Agradeço o seu interesse e divulgação deste work in progress.

Thereza Christina

Nota do CdL > correndo o mouse, pode-se ver logo abaixo neste blogue-jornal o poema I do mais puro amor. O número 3, bem, fica para outra hora...