Nesta sexta-feira, quando alguns estiverem no barraco do JB em Paraty para lembrar as travessuras literárias do poeta Manoel Bandeira, eu, Romualdo Fernandes, estarei na Sala Cecília Meirelles, no coração do Largo da Lapa, para ouvir, ver e me inebriar com a música de Mozart. Conosco estarão músicos de primeira e a nova estrela da trompa e do trompete à frente da Orquestra Sinfônica Brasileira. O novo enfant terrible é o francês David Guérrier, guerreiro Davi, solando o Concerto n. 4 sob a regência do maestro Marcos Arakaki.
Nesta sexta-feira, quando adolescentes estiverem ali fora da Sala Cecília Meireles, bem ao lado, consumindo bebida alcoólica na calçada, à revelia da lei que proíbe o consumo para menores, estarei com a minha turma vendo o jovem gênio interpretar também o dificílimo Concerto para trompete de J. N. Hummel.
Nesta sexta-feira, eu, Romualdo Fernandes, não estarei às 20h me despedindo de Ricardo Boechat, o âncora do Jornal da Band, nem me preparando para ver a performance do casal Fátima Bernardes e William Bonner no Jornal Nacional. Estarei lá mesmo, bem acomodado na minha poltrona, assistindo a um dos melhores instrumentistas da nova safra da música erudita. Guérrier fazendo a sua estreia no Brasil. Absolutamente imperdível. Já comprei meu bilhete pelo telefone 3344-5500 e não me arrependi. Não troco o meu lugar na sexta-feira nem por uma viagem cinco estrelas a Salzburgo porque me chamo Romualdo Fernandes e só faço o que gosto, só vou na boa.
Nesta sexta-feira, quando jornalistas ainda com diploma e professores curiosos do interior do Brasil estiverem bebericando entre turistas, palestras chatas, maresia do velho porto, entre uma nesga de luar e as incômodas muriçocas de Paraty, todos curtindo aquele show fliperâmico de vaidades, eu, Romualdo Fernandes, serei a pessoa mais feliz do mundo, no enlevo da Série Ametista, e agradecerei pessoalmente a Kurt Masur por propiciar uma noite de gala para a música clássica no Rio de Janeiro.
David Guérrier, um vibrato raro, plenitude, seríssimo e, ao mesmo tempo, serenidade, é relax quando toca para se emocionar e emocionar o mundo
Quem, lendo este meu recado, se já estiver agendado para outras paragens na noite de sexta, talvez tenha ainda no sábado a última oportunidade de, a partir das 16h, ver o espetáculo com o solista genial. Talvez os ingressos já estejam esgotados. Só não comprei ticket para repetir a dose no sábado porque não sou egoísta. Não faltou vontade, mas cedi ao bom senso, cedi a vez para que outras pessoas vivam a experiência de ouvir ao vivo David Guérrier.
Marcos Arakaki explica detalhes das peças que David Guérrier vai executar. A primeira é um dos quatro concertos para trompa de Mozart - todos escritos para o trompista (e vendedor de queijo) Joseph Leutgeb, um dos mais íntimos amigos do compositor austríaco. Neste quarto concerto, como em todos os outros, Mozart apresenta o instrumento como personagem heróico – soando quase como um protagonista de ópera. A segunda peça que Guérrier toca com a OSB é de Johann Nepmuk Hummel (1778-1837), aluno de Mozart e, como ele, criança-prodígio da música; estudou também com Salieri e Haydn.
O programa termina com uma sobremesa: a Sinfonia n. 1 de Sergei Prokofiev.
Se você for à Sala Cecília Meireles, por favor, não faça barulho na hora errada. Se estiver gripado, mesmo que não seja a influenza H1N1, não vá. Nem tosse nem pigarro. Não ameace uma noite de glória com o nosso excelso Amadeu.