Por Carlos Castilho - Carta Maior - de São Paulo
(Artigo publicado originalmente no site Observatório da Imprensa)
Fala-se muito na crise das publicações impressas, como jornais e revistas, mas quando se analisa os dados reais percebe-se que a situação é muito mais grave do que imaginamos e que a busca por novos modelos de negócios é ainda mais urgente do que se previa.
Quando você descobre que a Folha de S.Paulo, considerada um dos três mais influentes jornais do país, vendeu em média 21.849 exemplares diários em bancas em todo o território nacional entre janeiro e setembro de 2009, é possível constatar a abissal queda de circulação na chamada grande imprensa brasileira. Em outubro de 1996, a venda avulsa de uma edição dominical da Folha chegava a 489 mil exemplares.
Segundo o Instituto Verificador de Circulação (IVC) a Folha é o 24º jornal em venda avulsa na lista dos 97 jornais auditados pelo instituto, atrás do Estado de S.Paulo, em 19° lugar e O Globo, em 15° lugar. Somados os três mais influentes jornais brasileiros têm uma venda avulsa de quase 96 mil exemplares diários, o que corresponde a magros 4,45% dos 2.153.891 jornais vendidos diariamente em banca nos primeiros nove meses de 2009.
São números muito pequenos comparados ao prestígio dos três jornalões, responsáveis por boa parte da agenda pública nacional. Globo, Folha e Estado compensam sua baixa venda avulsa com um considerável número de assinantes, o que configura a seguinte situação: Os três jornais dependem mais do que nunca das classes A e B, que são maioria absoluta entre os assinantes, já que a população de menor renda é a principal cliente nas compras avulsas em bancas.
Esta constatação não é nova, mas ela aponta um dilema crucial: As classes A e B são aquelas onde a penetração informativa da internet é mais intensa. Nesta conjuntura, o futuro de O Globo, Estado e Folha depende umbilicalmente das classes média e alta, o que levou a uma disputa acirrada para saber qual deles interpreta melhor a ideologia destes segmentos sociais.
O atual perfil da imprensa brasileira mostra que os três grandes jornais nacionais agarram-se à classe média para manter assinantes e influenciar na agenda política do país, mesmo com tiragens reduzidíssimas, correspondentes a menos de 5% da média da venda avulsa nacional.
Nos últimos nove meses houve uma pequena recuperação nos índices de venda avulsa do Globo, Estado e Folha em 2009. O IVC registrou um crescimento de 5,5 % em relação aos quatro últimos meses do ano passado. É um aumento bem acima da média dos 97 jornais auditados pelo IVC, cuja venda avulsa diária total subiu insignificantes 0,27% no mesmo período. Mas a recuperação tem que ser vista num contexto de patamares muito baixos e que não garantem a rentabilidade futura dos jornais.
Em compensação os jornais locais e populares ocupam um espaço cada vez maior na mídia nacional. Dos dez jornais com maior venda avulsa, segundo dados do IVC, nove são claramente populares, voltados para as classes C e D. Destes, dois são de Minas Gerais, um do Rio Grande do Sul, cinco do Rio e dois de São Paulo. Somados eles chegam a uma venda avulsa diária média de 1.401.054 exemplares, ou seja 64,5% de todos os jornais auditados entre janeiro e setembro do ano passado.
O jornal Super Notícia, de Belo Horizonte, vende em bancas, em média, 290.047 exemplares (13,47% de todos os jornais auditados pelo IVC) - o que corresponde a cerca de 13,2 vezes a circulação avulsa da Folha de S.Paulo, em todo o país. Números que indicam uma clara tendência do mercado da venda avulsa de jornais no sentido das publicações populares, regionais, com apelo sensacionalista.
Isto também significa que os grandes jornais, tradicionais vitrines da agenda nacional, dependem, hoje, mais do prestígio herdado do passado do que do fluxo de caixa. A sua principal matéria prima, a notícia, perdeu valor de mercado em favor da opinião. Um prestígio que ainda alimenta uma receita publicitária compensadora, principalmente no setor imobiliário, de supermercados e revendas de automóveis, mas cujos dias também estão contados porque a migração destes segmentos para a internet é cada vez maior.
O conglomerado Globo aposta cada vez mais nos jornais populares regionais e segmentados - como o Extra, no Rio. Talvez busque inspiração no caso do Lance!, um jornal esportivo que vende, na média diária, 124 mil exemplares em bancas e jornaleiros. No sul, o grupo RBS aposta no Diário Gaúcho, o terceiro em vendas avulsas no ranking nacional do IVC e 8,4 vezes maior do que a do carro chefe do conglomerado, o jornal Zero Hora.
Carlos Castilho é jornalista.