sexta-feira, 25 de março de 2011

Coluna dos nossos dias (3): Merval Pereira Ricardo Ramos Dilma Irã Líbia Rosas de Fukushima


A Máquina ABL


O colega e meu ex-chefe Merval Pereira, colunista de O Globo, vai ser eleito para a Academia Brasileira de Letras agora em maio. Vai ter mais votos do que o escritor Antônio Torres.
A propósito, uns 20 anos atrás, meu saudoso pai Paulo Estellita Herkenhoff, na chácara do céu da Rua Barão da Torre, Ipanema, perguntou ao velho Braga: “Rubem, por que você não entra pra Academia? Lá nunca entrou nenhum capixaba! Rubem, o velho Urso, respondeu: “Paulo, vamos manter a tradição”.
Agora Ferreira Gullar, que seria eleição por aclamação, disse ao desistir de concorrer que não sente tesão em integrar a casa que já acolheu tantos maranhenses maravilhosos.

Uma pessoa fora da máquina de notícias é ninguém, é apenas um votinho, é moldável, maleável, amém. É preciso compreendê-las: a pessoa e a máquina.


­Mil verdades e algumas poucas mentiras sobre a Líbia

Antes de ser derrotado, morto ou de se render, Kadafi vai promover um banho de sangue.

Além dos contratos futuros envolvendo os poços de petróleo líbio com seus 8 milhões de barris diários, desperta interesse nos neo expedicionários cruzados a fortuna pessoal de Kadafi: alguns bilhões de dólares e um número desconhecido de lingotes de ouro enterrados nas imediações.

Pela riqueza pós-independência (1950) e pela riqueza desde o início da era do petróleo (1960), a Líbia tem um alto índice de qualidade de vida. Renda per capta alta para os 6 milhões de habitantes aglomerados no litoral. Um forte sentimento nacionalista. Os revoltosos das mais diversas facções não querem soldado estrangeiro pisando o solo líbio. Querem só o fim de Kadafi. Depois decidirão a forma de governo e escolherão os lideres.

País integrado, não existe rivalidade étnica ou tribunal de monta, isto é, com vocação sanguinária na Líbia.

Como parar os blindados e a artilharia pesada do coronel Kadafi apenas com aviões de guerra? Será possível sem desembarque de tropas? Na Coreia, Vietnam, Iraque e Afeganistão está provado que não. A vitória dos Aliados na Europa também foi tropa no chão. Supremacia aérea só ajuda. Não vence.


Governos a Síria e do Iêmen estão oferecendo anéis para salvar os dedos, oferecendo antecipação de reformas e abrandamento de certas leis draconianas para tentar livrar essas ditaduras democráticas de novas tunísias, novos egípcios... Mas, nesta sexta-feira, observamos: os protestos contra Assad Jr., o Rei de Damasco, estão se agravando.

Como os dois países vizinhos da Lìbia já derrubaram seus ditadores, não há alternativa para os líbios a não ser acabar com o coronel há 41 anos no poder.


Brasil Violento
no Amazonas e em Copacabana,
o adolescente e Ricardo Ramos

Os policiais que atiraram no adolescente amazonense à queima-roupa - e que meio minuto depois o socorreram - propiciaram uma imagem que causa indignação. Não fosse a filmagem, seria mais um caso entre outros a esquecer e esquecidos. Impressionante a tranquilidade com que desfecham os tiros no garoto magricela. Brasil, um país sem pena da morte. Morte sem pena nem dó, morte bancada pelo Poder Público. Impressiona também o fato de o Brasil se indignar mais com a imagem dos tiros do que com o tempo decorrido do crime, tempo de quase um ano. A barbaridade de hoje só veremos daqui a meses. Coisas da era digital.

Um jovem advogado que não advoga foi ferido a tiros em Copacabana no que parece ser um atentado político. A vítima dos pistoleiros, Ricardo Ramos, mantém um blog que ataca sistematicamente o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, o prefeito Eduardo Paes e segmentos da polícia, notadamente milicianos. O tal blogueiro parecia funcionário da oposição Serra/Gabeira. Tendo vencido Dilma Rousseff, Ricardo Ramos prosseguiu com seus ataques sistemáticos aos poderes federal, estadual e municipal. Suas críticas não são profundas, são retóricas, superficiais, mas emocionalmente impactantes. Paira a sensação de que escapou de uma execução, ainda que com três tiros, dois na cabeça. Explodiu no trend topic do Twitter, mas não comove o país de Lula e seus 80% de sufragadores de Dilma, entre os quais me incluo.


Dilma e Lula e Irã

Ao mandar votar contra o Irã na ONU – a entidade por isso vai mandar inspetor ver a questão dos Direitos Humanos na terra dos aiatolás -, Dilma Rousseff irritou principalmente duas pessoas: o presidente Hamadinejad e o próprio Lula. Dilma foi torturada, os dois, não.

Falando em Dilma, está rapidamente caindo por terra aquela teoria ou suposição de que ela estaria apenas guardando a cadeira para Lula voltar em 2014.


Oriente Médio e as rosas do terror
guardadas para o Ocidente


Itália e França em meio a alarmes de atentados terroristas...

Dois líbios protegidos por Kadafi derrubaram aquele avião no céu de Lockerbie, Escócia, matando mais de 200 ocidentais mais de 20 anos atrás. Foi o troco dado a Ronald Reagan na Casa Branca.

O atentado contra o Pentágono e as Torres Gêmeas foi o troco das ações de George Bush Pai e Bill Clinton no Oriente Médio. Qual será o troco da ação norte-americana sob o comando de Barack Obama? O troco ao Bush Filho foi dado pelo próprio presidente anterior, pelo ridículo de ter inventado provas de que o Iraque tinha armas de destruição de massa, pelo imbróglio que provocou na América ao entrar num Afeganistão incontrolável.

Cresce a discussão sobre a suposta existência de arsenal de arma química em poder de Kadafi. Gases venenosos.


Rosas de Florbela Camilo Vinicius Cecília Fernando

Eu deixo aroma até nos meus espinhos ao longe, o vento vai falando de mim. E por perder-me é que vão me lembrando, por desfolhar-me é que não tenho fim. Dai-me flores, muitas flores Quaisquer flores, logo que sejam muitas... Não, nem sequer muitas flores, falai-me apenas da rosa de Hiroxima a rosa hereditária a rosa radioativa Estúpida e inválida a rosa com cirrose a anti-rosa atômica sem cor sem perfume Sem rosa sem nada. Floriram por engano as rosas bravas no inverno: veio o vento desfolhá-las... Em redor do teu vulto é como um véu! Quem as esparze — quanta flor! — do céu, sobre nós dois, sobre os nossos cabelos? Pelo copinho de cristal e prata bebo uma saudade estranha e vaga Uma saudade imensa e infinita que, triste, me deslumbra e me embriaga.


Fukushima, meu jaburu

Uma hora diz que a água não é boa
Outra hora diz que a da torneira de Tóquio já dá
Uma hora a radiação diminui
Outra hora tem mais fumaça

A única coisa que não muda
É a ordem de Fukushima: evacuar.
Fui.


Ah... Eu deixo aroma até nos meus espinhos...
Fim

Por Alfredo Herkenhoff
Rio de Janeiro, 25/03/2011
Correio da Lapa