sexta-feira, 19 de junho de 2009

O antipático Hospital Samaritano

O que os bárbaros não fizeram, os Barberini fazem. A famosa frase, do tempo de Henrique VIII, dizia respeito à poderosa familia italiana que destruía todo o legado arquitetônico da Roma Imperial apenas para aproveitar materiais, mármore e bronze, na construção de igrejas. Caíram palácios, templos pagãos, tudo. Até o majestoso estádio do Coliseu, que era todo revestido com mármore de Carrara, foi depenado e, por isso, temos hoje só a carcaça da velha cova de leões e velho covil de gladiadores.

A frase dos barberini e estrangeiros - bárbaros - que saquearam Roma veio à baila porque depois de superar o choque de ordem, o Bar da Feira, em Botafogo, na Rua Vicente de Souza, aquele boteco diante de um calçadão e que ali promovia um som bacana, acústico, nas tardes de sábado até por volta das 10h da noite, agora está proibido, morto, silenciado na marra.

A ordem, a chave de galão contra o Bar da Feira, veio do Hospital Samaritano. o mais caro do Brasil. Este hospital, que atende quase somente pacientes ricos ou com altos planos de saúde, está comprando tudo no entorno. Sobrados velhos, prédios inteiros de apartamentos de dez andares. Está fazendo o que a Rede Globo já fez no Jardim Botânico: comprando tudo.

Claro que um hospital tem direito a silêncio. Mas há muitos exemplos de bons hospitais situados em artérias barulhentas de grandes cidades. Nestes casos, o hospital se blinda como qualquer estúdio de gravação. Nem é tão caro. Não é possível impedir o barulho normal e civilizado de uma cidade. Mas o Samaritano cheio da grana amplia suas dependências e, em vez de se blindar para não incomodar os paciente/clientes, incomoda o bairro.

O que o Samaritano fez foi um choque de ordem estilo miliciano, a ser verdade o recado que o português dono do Bar da feira diz ter recebido. Vocês param com este sambinha de nada a partir de hoje ou vamos cassar o alvará. Não duvidem. Ninguém duvidou. Entre os frequentadores do Bar da Feira, há funcionários, enfermeiros e outros do próprio Samaritano.

O Hospital, ao se ampliar, incomodou. É mais poderoso do que a lei. Quem tem coragem de peitar o Samaritano? Só um enfartado. Por que não um isolamento de som? O samba á tarde não é barulhento. A Rua Bambina já teve tráfego pesado de ônibus no passado, Se os ônibus voltassem, se os caminhões pesados passassem por ali, o Samaritano se blindava. Mas com sambista é mais simples. Vocês sabem com quem estão falando? Nós salvamos a vida dos poderosos e seus parentes. O que a gente pedir eles fazem.

É... Dançamos. O Samaritano não é mais o bom samaritano.

Na base da teoria dos exageros e da conspirações estapafúrdias, dizem que o Samaritano mandou parar o sambinha a 70 metros de seu novo anexo porque dois pacientes morreram ou quase morreram. Um porque foi à janela, viu a confraternização supercarioca e passou mal por não conseguir enganar o enfermeiro nem fugir com uma alta na marra. O outro paciente passou mal ao receber visita inesperada de uma ex-mulher que, vacilona, deixou escapar que estava ali no samba e lembrou da internação. Assim decidira visitar o ex, mas que já estava voltando porque tinha um bofe esperando por ela para cantar Paulino da Vila e Luiz Carlos da Vila. O doente carente e saudoso dela sofreu um princípio de enfarto ou dor no peito, fofoca de enfermeiro, se não é verdade, pelo menos graça tem.

By Alfredo Herkenhoff