quinta-feira, 2 de abril de 2009

Alfonsín morreu. História. O general Galtieri fez uma guerra e a derrota foi a vitória da redemocratização em Buenos Aires


Alfonsin e Galteiri, bom senso e loucura na Argentina

Por Alfredo Herkenhoff

Milhares de argentinos nas ruas de Buenos Aires para o adeus ao ex-presidente Alfonsín, que morreu aos 82 anos e foi uma espécie de Tancredo Neves que deu certo. Liderou a Argentina com estabilidade ao término da ditadura e, em sucessivos encontros com o presidente Sarney, acelerou o processo de integração econômica entre os dois maiores paises do continente através do Mercosul. Alfonsín enfrentou a ditadura nos anos de chumbo e chegou ao poder na esteira da tragédia da Guerra das Malvinas, ou Falkland war.

Esta guerra foi iniciada pelo general Leopoldo Galtieri que andava visivelmente embriagado pelos corredores da Casa Rosada quando mandou dez mil soldados desembarcarem nas ilhas geladas do Atlântico Sul. Lá, expulsaram uma guarnição de 80 soldados britânicos. A ditadura da Casa Rosada exibiu fotos do soldados argentinos fincando a bandeira nacional nas Malvinas. Ao mesmo tempo, do Aeroporto de Carrasco, em Montevidéu, as agências de notícias faziam fotos dos 80 soldados expulsos e que ali estavam jogados numa escala forçada a caminho de casa. Os 80 estavam humilhados, famintos e imundos.

Guerra durou apenas dois meses em 1982

A primeira-ministra Margaret Thatcher foi clara desde o primeiro dia: saiam, voltem para a Argentina, se não vamos expulsá-los à força das Falklands. Galtieri continuou tomando scotch. O secretário de Estado Alexander Haig fez diplomacia de ponte-aérea voando sem parar entre Washington, Buenos Aires e Londres. Tentou em vão evitar a guerra. Galtieri, disse Haig, saia porque a Inglaterra vem com toda a força. Mas o general só queria saber de beber uísque e ganhar uma guerra maluca, bem diferente daquela covarde guerra suja que matou 9 mil argentinos nos porões e em alto-mar. O cara de porre continuou achando que dava para segurar a onda.

Num certo sentido, Galtieri merecia ser lembrado por algo positivo que só pertence a ele como indivíduo. O porre do general ditador foi genial: trágedia dos mortos à parte, ajudou a acabar em poucos anos com várias ditaduras latino-americanas. O general, sem querer, acelerou o processo de redemocratização geral no continente. Ajudou sem querer a levar Alfonsin e o bom senso ao poder.

E um toque pessoal: Galtieri também foi o responsável pelo meu batismo de fogo na guerra contra o relógio diante das rotativas do velho e portentoso Jornal do Brasil. Pela primeira vez parei as máquinas para botar o início da guerra e aqueles afundamentos com submarinos e misseis Exocet, uma emoção silenciosa: contribuir com manchetes de capa, nas madrugadas, para aquelas edições que explodiam com impacto ao amanhcer nas bancas de revista, num tempo em que não havia internet e até telefonar era uma pequena dificuldade por causa da estatal Telerda da Vida.