O dia 10 de junho de 1942 foi a data de uma espécie de desembarque da Normandia da Liberdade na Praia da Ditadura de Getúlio Vargas
Por Alfredo Herkenhoff
Hoje, 10 de junho, nesta mesma data, em 1942, era lançado um manifesto defendendo a entrada do Brasil na guerra contra o nazifascismo. O acontecimento, guardando as devidas proporções, foi uma espécie de desembarque emocional na Normandia de um regime sanguinário. O país vivia uma ditadura e foi preciso desafiá-la abertamente para que a nação brasileira entrasse no conflito em defesa da democracia e da justiça. Assim como Washington e Moscou se uniram contra Hitler e Mussolini, intelectuais brasileiros de todos os matizes ideológicos assinaram o manifesto. Assinaram o documento os principais jornalistas, artistas, escritores e outros formadores de opinião.
Desde 28 de janeiro de 1942 a ditadura de Getúlio rompera as relações diplomáticas com Alemanha, Itália e Japão, mas o Estado Novo, tentando dar uma de espertalhão, insistia na neutralidade ao mesmo tempo que trocava investimentos americanos em siderurgia por uso do Nordeste como base militar de Washington.
O rompimento se dera um mês e meio depois do ataque de surpresa dos japoneses aos americanos em Pearl Harbor (7 de dezembro de 1941). Desde janeiro de 1942 o Brasil se mobilizava nas ruas, com estudantes e intelectuais pedindo a entrada da guerra pela liberdade e democracia que no Brasil não existia, mas o governo Vargas, dividido na cúpula, prosseguia em cima do muro, relutando em aderir ao esforço contra o terror das forças do Eixo, ou forças do Mal.
O manifesto de 10 de junho foi decisivo, mas o Brasil ainda precisou esperar 73 dias de covardia de Getúlio até que, em 22 de agosto de 1942, o ditador declarasse guerra a Hitler e Mussolini.
É bem provável que se Getúlio tivesse enrolado mais, teria sido deposto e novos governantes, em nome da democracia e com apoio da Casa Branca, assumiriam o poder com o objetivo claro de entrar imediatamente no conflito crucial para a sobrevivencia com liberdade.
Eis um pequeno trecho do manifesto pela entrada do Brasil na guerra contra o nazismo de 10 de junho de1942, e vejam alguns dos muitos nomes de ilustres brasileiros que endossaram o documento aqui hoje festejado no Correio da Lapa porque a favor da guerra significava, naquele terrivel momento histórico, a favor da liberdade.
TRECHO DO MANIFESTO DA GUERRA PELA PAZ
"(...) A guerra atual nada mais é que o choque histórico decisivo entre as forças progressistas, que visam a ampliar e consolidar as liberdades democráticas, e as forças retrógradas empenhadas em manter e alargar no mundo inteiro os regimes de escravidão e opressão. Nela se decide a liberdade dos indivíduos, das nações e dos povos (...) Este, o sentido fundamental da luta entre a Democracia e o Fascismo. A tradição invariável da política externa do Brasil tem sido no sentido da solidariedade e apoio aos países que lutam pela sua liberdade e independência. Dentro mesmo de nossas fronteiras lutamos sempre pelas liberdades democráticas (...) Nossa posição atual de unidade pan-americana na repulsa ao fascismo obedece, por isso mesmo, aos imperativos da nossa tradição histórica, da qual não é possível fugir sem contrariar o próprio sentido da nossa formação. (...) É preciso prevenir-se contra todos os que, persistindo ainda em seus desígnios monstruosos, continuam agindo como traidores da pátria, em conivência com os que a querem ocupar e destruir. Valendo-se para isso das manobras mais insidiosas, entre as quais cumpre destacar a de interpretar como tentativa de submissão aos Estados Unidos qualquer atividade em que os nossos esforços apareçam conjugados aos da grande democracia americana na repulsa continental aos invasores e aos seus regimes de opressão.
(...) Mais que nunca, o momento exige unidade de pensamento e de ação. Pensamento contra o fascismo. Ação contra o fascismo. Rio, 10 de junho de 1942".
GRANDES NOMES QUE O ASSINARAM DESAFIANDO GETÚLIO
Assinaram Oscar Niemeyer, Rubem Braga, Graciliano Ramos, Guilherme Figueiredo, Hermes Lima, Joaquim Cardoso, Joel Silveira, Cândido de Carvalho, Zé Lins do Rego, Josué de Castro, Lindolfo Collor, Lúcia Miguel Pereira, Luís Jardim, Manuel Bandeira, Moacir Werneck, Murilo Mendes, Odilo Costa, filho, Orlando Dantas, Pedro Nava, Procópio Ferreira, Afonso Arinos de Melo Franco, Álvaro Lins, Aníbal Machado, Aparício Torelly, Artur Ramos, Astrojildo Pereira, Augusto Meyer, Augusto Rodrigues, Aurélio Buarque de Holanda, Austregésilo de Athayde, Portinari, Carlos Drummond de Andrade, Carlos Lacerda, Clóvis Ramalhete, Dante Milano, Edson Carneiro, Emir Farhat, Evaristo de Moraes Filho, Francisco de Assis Barbosa, Prudente de Morais Neto, Rachel de Queiróz, Rodrigo M. F. de Almeida, Roquette Pinto, Samuel Wainer, Santa Rosa, Sérgio Buarque de Holanda, Viana Moog, Virgílio Melo Franco, Abgar Renaul e muita, muita gente mais.