Será que dá?
João Vicente Goulart, em conversa informal com os amigos
mais chegados, vem manifestando interesse em desafiar o chefe do PDT, Carlo
Lupi, e sair candidato à sucessão de Dilma Rousseff por esta sigla fundada por Leonel Brizola ao
fim do seu exílio no início da década de 80. Esta informação foi dada pelo
militante José Francisco Rodrigues, que
é filho do falecido coronel de Exército Dagoberto Rodrigues, exilado em 1964
por seu apoio incondicional ao presidente João Goulart e seu cunhado Leonel de
Moura Brizola.
Embora se lançando candidato a candidato a presidente do
Brasil, João Vicente sabe, presumo eu, que suas chances são mínimas. Mas sabe
também que ninguém faz uma bela caminhada sem dar o primeiro passo.
O primeiro é superar Lupi, uma liderança inventada por Brizola. Lupi era um jornaleiro e que terminou como ministro
do Trabalho defenestrado subitamente por Dilma Rousseff depois que uma
empresária o denunciou por cobrar propina. Hoje Lupi acusa a sua acusadora, mas
a pecha colou e desde então ele ficou mal falado nas ruas do Rio de Janeiro, do
tipo mais um desses políticos em quem não podemos confiar. Mas Lupi não dá
nenhum sinal de humildade dentro do PDT. E não podendo ele mesmo ser candidato,
talvez descubra que seu melhor candidato é ninguém.
João Vicente Goulart
Formado em filosofia e tendo exercido apenas um mandato de
deputado, João Vicente tem se dedicado a restaurar a verdade em torno de seu
pai, João Goulart, o único ex-presidente do Brasil a morrer fora do país, na
condição de exilado. Por isso mesmo, João Vicente, de 57 anos de idade, preside o Instituto João Goulart.
Entre tantas mentiras
envolvendo 1964, segundo João Vicente, está a de que seu pai fosse comunista,
como acusava a grande mídia insuflando a opinião pública e os militares a uma
quebra institucional, mentira que seu pai
fosse um frouxo, como acusavam os militantes de agremiações comunistas que, na ocasião,
defendiam, com outros radicais, a implantação de reformas na marra, mesmo com a
derrocada do Congresso Nacional.
João Goulart, ou
simplesmente Jango, era profundamente legalista. Quando os militares não quiseram
a sua posse na condição de vice depois da renúncia de Jânio Quadros em 1961, João
Goulart, conciliando, aceitou a implantação a toque de caixa do regime parlamentarista.
Depois veio o plebiscito que lhe restituiu formalmente o poder presidencialista.
Mas, de fato, nunca teve tanto poder. Governou
por pouco tempo tendo como pano de fundo a Guerra Fria, a Revolução Cubana, a
interferência norte-americana temendo que o exemplo de Fidel Castro se
alastrasse, o medo da burguesia brasileira mal acostumada com o descaso com a coisa
pública, a oposição da maioria no Congresso, o massacre diuturno de todos os
grandes meios de comunicação pregando o golpe, e até a oposição da Igreja
Católica temerosa com um possível avanço do comunismo na esteira de um governo apoiado
por sindicalistas, universitários e pequenos segmentos militares e de profissionais
liberais.
Joâo Goulart não quis reagir com o uso da força
como lhe garantia a Constituição porque teve a sagacidade de compreender que as
forças que o estavam derrubando eram infinitamente superiores aos segmentos que
o apoiavam.
Desferido o golpe militar, João Goulart evitou recorrer ao setor
do Exército disposto a defendê-lo porque isso só iria gerar um banho de sangue,
quiçá uma guerra civil. Jango mandou sua família logo para o Uruguai, mas
permaneceu clandestinamente no Brasil até que o deputado Ranieri Mazzilli
assumisse a Presidência como o nome escolhido provisoriamente pelos golpistas,
ainda que congressistas tivessem declarado a vacância do cargo pela ausência do
mandatário. Mas João Goulart estava em território brasileiro naquele momento do
2 de abril.
No seu trabalho à frente do Instituto João Goulart, João Vicente tem se mostrado simples e didático, não poupa
críticas ao modo como os grandes meios de comunicação, ainda que perdendo cada
vez mais influência para a internet, ditam verdades que não se confirmam.
Bem, fiquemos com o trecho dessas considerações do João
Vicente acerca da triste política dos nossos dias, palavras dele em entrevista concedida
em março passado, na qual tratava dos 50 anos do golpe que derrubou seu pai, então
atacado por mentiras de todos os lados:
"Eu digo sempre que nossa obrigação como seres humanos é
constantemente nos mantermos como seres políticos, mas não necessariamente
seres eleitorais em um país onde nossos congressistas são vistos como escórias
diante da opinião pública. E por que? Assim será, enquanto não fizermos uma
profunda reforma política, onde possamos eleger verdadeiros representantes de
nosso povo para que nos representem, para que nos dirijam, para que conosco
construam uma alternativa clara às necessidades sociais e não pessoais. Até lá,
não teremos dignidade e nossos representantes serão meros bonecos a serviço de
seus financiadores.Não é possível que para se eleger um deputado em São Paulo
se necessite de R$ 5 milhões, ou R$ 6 milhões. Eu não tenho esse dinheiro e
para obtê-lo teria que vender minha atuação parlamentar para aqueles que me
financiarem. Votar contra os interesses do povo caso estes atinjam, contrariem
os interesses dos financiadores. Por isso temos aí as bancadas da bala, bancada
ruralista, bancada da medicina, bancada dos evangélicos, bancada disto e
daquilo. Este não é o parlamento que sonho. Lamentavelmente, os partidos
políticos querem manter seus privilégios e aqui no Brasil ainda são
classificados como de direito privado, o que é um absurdo quando um cidadão
filiado quer questionar o comportamento de seu dirigente.O debate político se
transformou em debate eleitoral; o de questionamento ideológico em balcão de
negócios de espaços televisivos à venda; o doutrinário em aprendizado de
coligações espúrias para fazer o número suficiente de deputados federais que dê
aos dirigentes partidários o acesso ao Fundo Partidário; os sonhos de
ideologização democrática, em traições e armadilhas de conchavos pela
manutenção do poder pelo poder. Algo tem de ser mudado. Quem sabe rever dentro
das reformas de base, e também fazer uma reforma eleitoral ampla para
dignificar os mandatos e para que nossos parlamentares sejam orgulho de nossa
população”. (Por Alfredo Herkenhoff)