Verdades e mentiras
sobre a fortuna de Eike Batista
Por Alfredo Herkenhoff *
Recebemos nesses tempos de internet uma carga de informação enorme, não importa se você é um banqueiro ou um bancário, um repórter novato ou o dono de um grupo de comunicação. A informação, algo tão crucial para que uma pessoa tome decisões corretas, continua sendo, mais até hoje do que antes, uma ferramenta também para que uma pessoa seja induzida a tomar decisões, ou seja, conduzida a tomar decisões que talvez não sejam corretas, ou não sejam as melhores.
Não basta ter dinheiro para investir, não basta ter recursos, é preciso parecer de forma verdadeira que se tem muito mais do que se tem de fato. Esta aparência permite que a pessoa, dispondo dessa imagem de muita grana, empreenda novos negócios, fature mais, atraia capitais de olho em oportunidades.
Mas se você quiser se dar ao trabalho de descobrir o que de fato significa um bilionário a mais no mundo, veja o que ele fez, o que faz e o que fará.
No mercado acionário, você compra e vende ações... São números frios que o computador exibe milimetricamente todo dia. Já na bolsa de mercadorias e futuros, os números são expostos como se fossem reais, quando não passam de um comercio fictício, mas necessário, sobre expectativas.
Uma bolsa de futuro negocia valores 30 ou 60 vezes mais altos do que o total de negócios de uma bolsa acionária. Aqueles números altíssimos indicam apenas contratos de aposta: eu compro (aposto) 2 milhões de toneladas de trigo a tal preço daqui a seis meses.
E findo o prazo, alguém que apostou diferente, firmou contrato de venda de 2 milhões de toneladas a outro preço, se verá diante do seguinte quadro: o preço ficou mais alto do que supus e devo pagar a diferença. O preço ficou mais baixo do que eu quis comprar, devo receber a diferença. Esse mercado serve para avaliar expectativas, fornecer informações para que empresas e empresários tomem decisões. Mas não há compra e venda de nenhum quilo da farinha. Os valores altíssimos exibidos por bolsas de futuros representam valores módicos, os percentuais mínimos das diferenças de palpites sobre cotações futuras de tudo: comida, ouro, juros.
Essas revistas Forbes da vida, no atacado, mostram números relativamente próximos da realidade no campo dos mais ricos do planeta. Mas no varejo das aparições, não, no varejo elas correm o risco de apenas endossar políticas de visibilidade de alguns nomes. Estas visibilidades, por sua vez, catapultam certos nomes, permitido que façam maiores e melhores negócios no futuro imediato. Suspeito que em parte seja este o caso de Eike Batista. Mas não tenho provas.
Quem bota dois no um, quatro no dois e oito no quatro, sabe que chegará à casa 64 do tabuleiro do xadrez, chegará à fortuna máxima. Quem não guarda um tostão, não chegará a ser o número 1. De grão em grão, a galinha enche o papo. Foi pensando umas caraminholas que comecei a observar a performance Eike/Forbes. Vejamos: a julgar pelo levantamento da revista, em 2007, estando Eike Batista ausente da lista daquele ano com os seres humanos com mais de 1 bilhão de dólares no bolso, o ex-marido de Luma de Oliveira deveria, no máximo, possuir na ocasião apenas 999 milhões 999 mil dólares, entre bens e sonhos.
Ou então a revista Forbes estava errada ou não teve argúcia para ver que já havia um bilionário a mais dando sopa no mundo.
No início de 2008 (a Forbes sempre lança a lista dos mais ricos no fim do inverno em Nova York), Eike aparecia com mágicos 6 bilhões e 600 milhões de dólares. Donde se conclui que, um ano antes da crise financeira nos EUA, o filho de Eliezer Batista acumulou em média uma riqueza de meio bilhão de dólares a cada mês.
Em 2009, com o presidente Lula dizendo que a onda de 2008 era crise mundial do tipo marola, Eike Batista passou a ser o bilionário com letra B de número 61 do mundo, com 7 bilhões 600 milhões no bolso. Donde se conclui que acumulou fortuna com média mensal pequena, de cerca de 80 milhões de dólares por mês naquele ano.
Em 2010, a Forbes diz que Eike Batista tem 27 bilhões de dólares, isso significando que acrescentou à fortuna, em um ano, mais 20 bilhões, ou, a cada mês, ganhou 1 bilhão 500 milhões de dólares.
Em 2011, sempre como o oitavo mais rico do mundo, Eike parece com 30 bilhões de dólares, ou seja, no ano passado, enriqueceu apenas mais 3 bilhões de dólares, isto é, botou no seu cofre mágico, a cada mês, a bagatela de 250 milhões.
Donde se conclui que eu estou errado, mas nunca vi nada de Eike Batista tão grandioso assim. Ah! Ele tem mina de carvão na Colômbia, mina no Chile, mas nunca estive lá. Ah! Eike está fazendo o mega porto em São João, mas até hoje não levou nem trouxe nenhum grão de nada. Vejo apenas um projeto, um extenso píer de atracação. Ah, mas trouxe o presidente da Hyundai, mega indústria coreana, indícios de planos para um pólo de estaleiros no Norte fluminense. Será? Ah! Ele é o dono da litorina Curitiba-Paranaguá, mas esta ferrovia existe desde o tempo do Império. Ah! Vai refazer o trenzinho para subir a Petrópolis pelo fundo da Baía de Guanabara? Vai despoluir a Baía? É apaixonado pelo Rio? E daí? Somos todos. Sim, ele comprou o belo Hotel Glória! Que faça bom proveito! Ele firmou contrato de venda de petróleo com a Shell, um ano atrás, petróleo que ele descobriu na Bacia de Campos. Mas não extraiu ainda uma gota sequer.
Vejo outros ricos mais palpáveis: uns vendem cerveja, outros, televisão, outros celulares, outros, ferro, aço, carro, entretenimento. Mas não vejo Eike Batista vendendo nada, parece que está só comprando. Inventa projetos, vende projetos e compra adeptos, ou sócios. Tem um barco dele que perambula pela Marina da Glória, mas é tão mixuruca perto dos mais belos iates do mundo...
Puxa! Tenho certeza de que estou errado. Eike está cercado de globais, príncipes árabes, pilotos aéreos e pilotos náuticos, esportistas, mas acho tudo tão pouco. Algo me diz que ele não é tão rico assim. Acho tudo isso ainda muito pouco para quem não era ninguém na Forbes no ano de 2007.
Nos botequins da vida, ficam dizendo por aí que Eike ficou rico graças ao conhecimento privilegiado sobre minas e mineração em função de seu pai ter sido presidente da Vale no tempo em que era estatal. Bobagem. Eike é muito mais perscrutador de mídia do que de subsolos. Não me interessa papo sobre Serra do Navio. Prefiro compreender por que Eike deu de falar domingo à noite no Fantástico, ou sábado à tarde no Luciano Huck. Já não basta a Forbes? Decidiu estender o manto da fama a todo o povo brasileiro. O rei não está nu, mas anda apressado. Com a fama que ganhou como o mais rico do Brasil, vejo em Eike a chance ou o sonho de se tornar o mais rico do mundo.
* Escritor e editor do Correio da Lapa
Rio de Janeiro, 10 de outubro de 2011