sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Liesa denunciada. Dudu Nobre é chamado de "notável idiota"

O escritor e jornalista Marcelo Moutinho acusa a Liesa de propiciar fraude na Sapucaí por causa da queda da escola Império Serrano. Moutinho, imperiano de carteirinha, tem o blog Pentimento*, no qual trata de cultura, cinema, samba e principalmente literatura. Nesta sexta, ele botou na rede o seguinte texto em que sobra malhação também contra o sambista e comentarista Dudu Nobre:

O MAIOR ASSALTO DO CARNAVAL

Quando caiu para o Acesso em 2007, o Império Serrano fez por merecer a queda. Neste ano, muito pelo contrário, a Serrinha passou leve, bonita e animada - foi, sem dúvida, a escola que mais levantou o público na Sapucaí (se não a única) - e se viu vítima de um assalto. Um vexaminoso assalto, praticado pelos célebres criminosos que comandam o carnaval carioca. Mais um crime se soma às suas longas folhas corridas.

O Império ficou entre as melhores escolas de 2009 segundo os espectadores da TV Globo, os ouvintes da Rádio Tupi e os críticos do site Carnavalesco. Nos jornais, o desfile foi unanimemente elogiado, inclusive pelo fato de agremiação ter adequado o carnaval às suas condições financeiras. Exemplo: ao invés de apresentar carros imensos, mas defeituosos, como a Mangueira (a inclusão da velha Manga entre as campeãs é uma piada), levou à Avenida alegorias menores, porém perfeitamente acabadas e - o mais importante - alusivas ao enredo (o que não aconteceu na maioria das coirmãs - o caso da Mocidade Independente é apenas o mais flagrante).

Não vou me estender sobre a falta de critérios do júri medíocre e despreparado (corrupto?) da Liesa. Caso o carnaval continue nas mãos da corja de vagabundos que dirige a entidade, veremos o filme se repetir: a escola que sobe, cai no ano seguinte, ainda que se apresente melhor do que as demais. E há escolas intocáveis. Isso acontece diante de um poder público omisso e de uma imprensa subserviente - a maioria dos jornalistas que atuam na área não se incomoda em trocar a consciência crítica por uma porção de bolinhas de queijo, um prato de sushi e algumas doses de uísque.

Passo a palavra à amiga Daniela Name, de quem recebi um e-mail tão indignado quanto verdadeiro: "Há anos, as escolas com menos padrinhos são penalizadas por não terem carros gigantescos. Carnavalescos vão aos jornais para disputar: "O meu é maior que o seu". So vale Golias nas alegorias e adereços. Nos outros quesitos, que privilegiam a música e a força cultural da folia, a lógica se inverte: uma escola com enredo louco, samba-enredo café com leite e bateria mediana muitas vezes leva a mesma nota ou nota maior do que a agremiaçao que tem ala de compositores poderosa e bateria irretocável. Este é o caso do Imperio, cuja bateria Estandarte de Ouro ganhou 9,9 de um dos jurados.

(...) Mangueira e Mocidade nunca foram rebaixadas. O Império veio do Grupo A. Isso parece ser o suficiente para mandá-lo para lá novamente"

A análise é precisa. O escândalo, porém, não mereceu um mísero espaço na imprensa. Os jornais (os mesmos que tanto elogiaram) limitaram-se a afirmar que o Império se transformou numa "escola iôiô". Por que será? Que tal investigar um pouco (obrigação do jornalista)? Que tal comparar as notas? Que tal tentar ser menos passivos diante da poderosa Liesa?

Ontem estava triste, hoje estou enojado. Mas gostaria muito que vocês lessem o ótimo artigo que o Carlos Andreazza escreveu lá no Tribuneiros (e publico a seguir). Concordo com ele do início ao fim.

"Império: um filho do verde esperança não foge à luta"

Carlos Andreazza

"Vi todos os desfiles e escrevo de peito aberto: apenas quatro escolas de samba desfilaram melhor que o Império Serrano em 2009 - as quatro primeiras, Portela inclusive.

O Império foi roubado; tungado pela canalha bandida que comanda o carnaval do Rio de Janeiro. (E o leitor pode se preparar: sinto-me um palhaço agora, um trouxa, é verdade, mas não abandonarei o barco; vestirei a camisa mais do que nunca, mais orgulhoso do que nunca, e isto aqui vai virar um inferno).

O que se consolidou ontem, inequivocamente, não foi a absoluta rejeição ao tipo de carnaval desenvolvido pelo Império, mas a própria impossibilidade do carnaval. A negação.

E é duro, para quem viveu este desfile, para quem esteve lá, para quem se emocionou tanto e acreditou tanto, para quem sentiu a reação do público, para quem viu as lágrimas escorrerem do rosto daquela senhora, é duro receber [compreender] esta morte - este assassinato.

Gostaria, sinceramente, de falar que “chega“, que cansei, que escola de samba acabou pra mim, que doravante será só saudade - mas não. Eu ainda acredito. Não sei muito bem em quê, não sei como, mas ainda acredito. Eu acredito muito na força do Império Serrano - e preciso do Império Serrano.

Talvez fosse fácil escrever agora que, apesar de tudo, valeu; que o que importa nós fizemos, construímos no chão, no asfalto, como escola de samba. Isto, contudo, seria egoísmo. E mentira. Isto seria fechar entre os que desfilaram o sentimento de que o resultado, extraordinário, nós colhemos ali, na avenida, a cada passo e sorriso, a cada cadência de um momento raro. Mas não: quem esteve lá, quem rasgou aquela Sapucaí com o canto em riste, quem ladeou o miudinho de Felipe Moura Brasil, quem viu a minha Renata, linda, radiante de alegria, quem reparou no improvável passista em que se transformou João Paulo Duarte, brincando e se divertindo o tempo todo, quem foi tão feliz e inteiro quer ver a sua harmonia, a sua plenitude reconhecida e homenageada; quem esteve no desfile do Império Serrano, quem passou com ele ou o viu passar, sem nada ter com o julgamento, quer pedir - quer gritar - desculpas pelo décimo furtado à insuperável bateria da escola. Porque isso é dor.

Ao contrário de 2007, ano em que mereceu o tombo, este rebaixamento do Império Serrano é um golpe escandaloso contra o samba - e se deu, para delírio do dinheiro sujo [para a farra dos bicheiros sócios do poder público], nas mesmas bases que descrevi no artigo Vamos julgar os jurados?. (Aqui).

Ocorre que nós não vamos nos calar; não podemos. Não mais. E esta será, creio, a posição oficial do Império Serrano: romper com a contravenção - com o carnaval dos bicheiros obscuros, com o lixo chamado Liesa. Botar a boca no mundo; ir pro pau. Sem medo. O Império não é uma escola de bandidos - e não pode seguir de cabeça baixa ante as evidências de que é o boi-de-piranha desses vagabundos do crime organizado. O Império Serrano não faz jogo de carta-marcada. É hora de assumir a posição de grandeza que é historicamente imperiana. É hora de cobrar. E cobraremos da prefeitura, sem cessar, o controle urgente sobre um evento que se faz, em boa parte, com dinheiro público. O prefeito Eduardo Paes, se não quiser dar linha ao crime concebido e empreendido por Cesar Maia, precisa compreender que a Liga Independente das Escolas de Samba, esta imoralidade, é inimiga do Rio de Janeiro, cujos melhores valores insiste em derrubar.

Não é tempo de omissão.

(O tal Jorge Castanheira, presidente da Liesa, com sua pinta de síndico competente, nada mais é que marionete da cúpula do jogo do bicho; o carnaval do Rio de Janeiro, porém, segue comandado por assaltantes da laia de Capitão Guimarães, o torturador - e é lamentável que também a tevê Globo, encenando a farsa, legitime este grupo de contraventores como uma entidade administradora séria).

Tenho simpatia pela Mangueira e especialmente pela Mocidade Independente - mas, neste carnaval, em quesito algum do mundo, estas escolas poderiam aparecer à frente do Império. A Mangueira despencava pela avenida; Padre Miguel exercitava todas as possibilidades do mau-gosto… E o que dizer de Porto da Pedra, Viradouro e Unidos da Tijuca? O que essas agremiações fizeram pelo espetáculo senão o cultivo insolente da mediocridade?

As gentes - jurados sobretudo - dão-se com alegorias imensas e lotadas, que acumulam rococós sem sentido, e se impressionam, deslumbradas… É a leitura - a visão nouveau riche - do mundo cuspida no carnaval. Não interessa a clareza, a elegância, a leveza, a concisão sobre o que se quer passar. Eis o segredo do carnaval das escolas de samba, amplamente aplicado pela Grande Rio: na dúvida [ou na certeza da própria incompetência], entulha-se o carro de barroquismos e vamos que vamos. A estupidez valerá cada nota 10.

Custei muito a acreditar, ingênuo talvez, mas estou afinal convencido de que o resultado que a quarta-feira de cinzas nos trouxe estava estabelecido há exatos doze meses, quando o Império Serrano venceu o Grupo de Acesso. Ali, no instante em que subia, tão feliz e esperançoso, descia. (O mesmo se dará com a União da Ilha em 2010, escola que, de resto, não mereceu o acesso, beneficiada pela perseguição à Estácio de Sá).

Ouvi o notável idiota de nome Dudu Nobre, sujeito asqueroso, puxa-saco lastimável, sub-sambista que despreza o carnaval na mesma medida que o desconhece, dizer que faltou ousadia ao Império Serrano - e ousadia foi justamente o que sobrou, felizmente.

É preciso muita ousadia, coragem, muita confiança nas suas qualidades, para desfilar um carnaval de verdade hoje na Sapucaí; para botar uma escola no chão, para investir no samba, no peso do samba, nas características do samba, para dar vez e espaço aos seus. O Império Serrano acreditou - acredita - num carnaval direto, horizontal, franco, limpo, transparente; e por isso, claro, pela transparência absoluta, foi punido.

Mas o Império, que tem patente, voltará. O Império é patrimônio do Rio de Janeiro. E vamos à briga. E vamos à briga!

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Grande campeão foi o Salgueiro. A academia, porém, merecia a honra de um samba-enredo melhor.

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Há uma movimentação, anterior aos desfiles, para que nenhuma agremiação do Grupo Especial seja rebaixada. O Império nada tem com isso e, embora fosse o grande beneficiado com a transgressão, estou seguro de que jamais aceitaria qualquer virada de mesa."

* Jornalista e editor do blog Pentimento
Endereço http://www.marcelomoutinho.com.br/blog/